quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Hora do Conto

A história «A Ana e a Bolinha de Sabão», faz parte do livro «A Cidade de Vidro», e fala da viagem de uma bola de sabão.
Como instrumento lúdico de mediação de leitura, esta história foi projectada num livro gigante, onde as páginas feitas em tapete deliciam-nos com a magia das imagens concebidas em tecido. A própria cor e a textura, transportam-nos para o mundo da fantasia, e, criam momentos cúmplices entre o mediador e a criança.
Como objectivos, existe a preocupação de promover a relação criança/livro, assim como apurar os cinco sentidos.


Este historia vai ser contada no proximo dia 22 de Novembro as 15h30 nas instalações da APPDA-Norte, por isso inscrevam os vossos filhos.

INSIDE VISION - Perguntas

Apos uma troca alargada de email com a Kalen e o Martijn sentimos que ficaram muitas perguntas por fazer durante o Inside Vision.

Por isso a Kalen e o Martijn disponibilizaram se a responder a todas as perguntas que sejam colocadas atravez deste blog, para fazer as perguntas apenas têm de adicionar nos comentarios as perguntas identificando se e mais tarde a resposta sera publicada no blog.

O objectivo deste "forum" é preparar o proximo Inside Vision no ano de 2009.

Nova Unidade Ensino Estruturado

O concelho de Baião, que regista os mais baixos índices de escolaridade do distrito do Porto, inaugura amanhã o seu primeiro centro escolar. Um investimento de 1,4 milhões de euros que inclui uma unidade para crianças com autismo. (...)
"O Centro Escolar de Baião será o primeiro do distrito do Porto com unidade de ensino estruturado para crianças com o espectro de Autismo. Com capacidade total para seis utentes, esta unidade vai servir crianças de Baião e de concelhos vizinhos como Penafiel, Marco de Canaveses ou Amarante", acrescentou a fonte da autarquia.
Esta unidade de ensino terá uma sala de trabalho estruturado, onde os alunos serão acompanhados por dois profissionais da área do ensino especial e uma sala de lazer, com equipamentos adaptados a crianças com necessidades especiais.
O Centro Escolar de Baião tem 12 salas de aula e capacidade para 240 alunos do Ensino Básico, provenientes das freguesias de Campelo, Ovil e Loivos do Monte, e substitui sete antigas escolas que encerraram nos últimos anos.O equipamento escolar dispõe ainda de um salão polivalente e salas para atendimento aos Encarregados de Educação e Associação de Pais.
Para as actividades de enriquecimento curricular foi criado um polidesportivo ao ar livre, com cobertura. Graças à proximidade com a Escola EB 2,3/S de Baião, os alunos do Centro Escolar vão utilizar a cantina e a biblioteca daquele estabelecimento de ensino.
Educare

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Noticias Inside Vision

Ja se encontra disponivel os DVD's do Inside Vision, sendo assim apenas terão de enviar um email para insidevision.opo@gmail.com com nome e morada e dentro em breve receberam em casa.

domingo, 26 de outubro de 2008

Dentro do Inside Vision

Apos a realização cabe fazer o balanço, eu vou dar o meu ponto de vista de organizadore de quem esteve dentro mas gostava que quem esteve presente desse o seu testemunho pois isso ira ajudar o proximo Inside Vision.

Começo a por dizer que todos os objectivos que me coloquei foram totalmente atingidos, primeiramente o objectivo de colocar a comunidade que envolve os Autistas toda junta foi largamente conseguida, estiveram presentes familiares, pais, tecnicos, psicologos, pedopsiquiatras e fundamentalmente AUTISTAS. Juntar toda esta comunidade deixou com muito orgulho pois senti que todos querem estar envolvidos e perceber os nossos filhos para lhes poderem dar a melhor qualidade de vida respeitando-os.

Mas vamos ao que interessa de facto que foi o Inside Vision, o Inside Vision começou um pouco atrasado pois houve um problema de personalidade entre o portatil Mac e o projector. Resolvido o problema tecnico foram dadas as boas vindas e iniciou se as comunicações, a primeira apresentação foi do Martijn Dekker que surprendeu a plateia falando em Interlingua resolvendo o problema da lingua pois todos que estiveram presentem entenderam sem dificuldade toda a comunicação do Martijn.
O Martijn iniciou a sua intervenção dando um pouco da sua biografia e logo apos centrou o seu discurso sobre os aspectos positivos do Autismo, demonstrando que a triade do Autisto que focaliza se apenas nos aspectos negativos, então o Martijn deu o "Verso da Medalha" mostrou a plateia os aspectivos positivos que o autismo têm. Deste ponto de partida o Martijn desenvolveu este conceito, dando despois sujestões sobre como a escola e os locais de trabalho poderiam se organizar para que o ambiente seja amigavel a um Autista.
Em conclusão o Martijn pediu respeito pelos autistas, que a sociedade crie melhores acessobilidade para as pessoas com autismo e que não tentem tirar o autismo de um autista porque isso seria ter uma pessoa completamente diferente.

A apresentação da Kelen Molton centrou se em volta do Autscape, demonstrando as dificuldades que os autista têm mas que as conseguem ultrapassar para a realização do Autscape. Depois mostrou o conceito do Autscape mostrando o que não é um ambiente amigavel para um autista e demonstranto como o Autscape torna se um paraiso para um autista. Finalmente a Kalen falou sobre a sua experiencia de ter sido presidente do comite do Autscape durante 4 anos.

No final o Andre falou sobre a sua experiencia no Autscape, dizendo mesmo que se sentia que o Autscape seria a sua casa.

Para quem estiver interessado em receber os handout de cada um dos participantes e tambem vai estar disponivel o video da conferencia.

Apenas teram de o solicitar atraves do email insidevision.opo@gmail.com

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Nova visão espalha se na Europa

La Educación de las Personas con Autismo"
Salvador Repeto. Psicólogo. Asociación de Padres de niños autistas de Cádiz. España.

EL AUTISMO: DÉFICIT COGNITIVO

Desde que Leo Kanner describió a 11 chicos y chicas con autismo, en 1943, hasta los años 70, la idea acerca de cuál era la naturaleza de la alteración que afectaba a esas personas giraba alrededor de los trastornos de la personalidad. Durante mucho tiempo, el autismo fue concebido como una psicosis infantil, y tratado, aunque con poco éxito, como tal. Afortunadamente, el trabajo constante y directo de muchos profesionales con estos chicos les hizo centrar su atención en las dificultades que presentaban cuando se les trataba de educar. Se describieron, cada vez con mayor precisión, una serie de importantes carencias en los niños con autismo, junto a otras capacidades llamativamente cercanas a la normalidad. Las más importantes de esas carencias, generalizadas en toda la población de alumnos con autismo, se fueron describiendo en tres áreas del desarrollo cognitivo, la comunicación, la interacción social recíproca y la imaginación. Consecuencia de este cambio en la idea sobre la naturaleza del autismo fue que se dejó de hablar de Psicosis Infantil (enfermedad mental), para hablar de Trastorno Generalizado del Desarrollo (TGD). Esto es, se concibe el autismo como un desarrollo alterado de las funciones cognitivas del chico. Desde los primeros ’80, numerosos investigadores han realizado diversas hipótesis acerca de cuál pueda ser el déficit cognitivo básico que explique dichas alteraciones en el desarrollo. La hipótesis de la Teoría de la Mente, expresada por Baron-Cohen en 1985, ha sido, con mucho, la que más y mejores aportaciones ha realizado a la comprensión del autismo. Esta hipótesis dice que la persona con autismo padece una importante dificultad para atribuir estados mentales tanto a sí mismo como a los demás. Para la persona con autismo, el mundo de las mentes resulta prácticamente inaccesible, padecen "ceguera mental". Otra teoría acerca del déficit cognitivo básico en el autismo, relacionada con la anterior, aunque no tan desarrollada como ella, es la expresada por Uta Fritz, sobre el fracaso en la "coherencia central".

En definitiva, e independientemente de cuál sea, o cuáles sean, los déficits cognitivos básicos, la cuestión es que, en la actualidad, pocos científicos ponen en duda la existencia de los mismos. Así pues, el Autismo, los TGD, son considerados, al igual que el retraso mental, la ceguera, la sordera y la parálisis cerebral, una minusvalía que puede afectar al niño en la infancia. Ser una persona con autismo es estar en el mundo con unas características determinadas, pero con las mismas necesidades que las otras personas. Naturalmente, esto está muy lejos de la antigua idea de que el niño con autismo posee todas las capacidades de un chico sin problemas, aunque las alteraciones que sufre su personalidad le impiden manifestarlas en su plenitud.

LA RESPUESTA EDUCATIVA

Siendo esto así, ¿cuál sería la mejor manera en que, padres y educadores, deberían tratar a sus hijos y alumnos con autismo?

Las teorías anteriores centraban sus esfuerzos en la desaparición, o control, de las alteraciones de la personalidad (aislamiento, incomunicación, obsesiones...), con el fin de poder aplicar, posteriormente, las técnicas educativas comunes a los demás chicos.

Por otro lado, la consecuencia evidente del autismo como déficit cognitivo es la priorización de los esfuerzos educativos (estos chicos necesitan aprender habilidades, conocimientos y actitudes para poder desenvolverse en el mundo, como todos los demás), junto con la adaptación de sus objetivos y técnicas a las peculiaridades cognitivas de estos alumnos/hijos.

No se trata, en definitiva, de hacer desaparecer unas alteraciones para que "aflore" el desarrollo nomal del niño y pueda adaptarse al mundo que le rodea. Se trata más bien de facilitar su desenvolvimiento en éste, realizando en su entorno las adaptaciones necesarias y desarrollando al máximo las posibilidades cognitivas del chico. Esto se realizará con el fin de que sus déficits cognitivos tengan la menor repercusión posible en su adaptación al mundo en que ha de desenvolverse.

DÓNDE EDUCAR

Si el objetivo de nuestros esfuerzos educativos es mejorar las posibilidades del chico con autismo para desenvolverse en su entorno cotidiano, es lógico pensar que el lugar más adecuado para educarle habrá de ser dicho entorno. Ahora bien, este entorno es, generalmente, múltiple, compuesto por otros entornos (hogar, colegio, barrio, familiares y amigos, vacaciones...). Esto significa, en el caso de las personas con autismo, aunque probablemente no sólo en este caso, que los esfuerzos de los educadores (profesionales y padres) habrán de desarrollarse no sólo fuera de los hospitales y las consultas de los clínicos, sino también, al menos parcialmente, fuera de las aulas escolares. Así pues, el hogar, el supermercado, la piscina pública, el parque, los transportes públicos..., se convierten en lugares idóneos para educar a las personas con autismo.

SOBRE QUÉ EDUCAR

Las necesidades educativas del chico con autismo son las mismas que las de cualquier otro chico de su edad. Ambos necesitan desarrollar aquellas Habilidades Adaptativas que le permitan desenvolverse en el mundo que les rodea. La diferencia está en el tipo, la cantidad e intensidad de los apoyos que cada uno de ellos necesita, tanto para desarrollar dichas habilidades, como para poder desenvolverse en ese mundo.

Así pues, la persona con autismo necesita desarrollar las Habilidades Adaptativas ya descritas por la AAMR: Comunicación , Autorregulación, Cuidado Personal, Vida en el hogar, Habilidades académicas funcionales, Habilidades sociales, Salud y Seguridad, Uso de la Comunidad, Ocio y Trabajo. Cualquier mejora que, mediante nuestros esfuerzos educativos, logremos en el desarrollo de algunas de estas Habilidades Adaptativas tendrá una repercusión directa en la mejora de la Calidad de Vida de la persona con autismo, objetivo final de toda intervención a favor de la misma.

No obstante, en la mayoría de las personas con autismo, y debido a sus peculiaridades cognitivas, los esfuerzos educativos habrán de centrarse, de forma muy especial, en las Habilidades de Comunicación, Autorregulación, Habilidades Sociales, Uso de la Comunidad y Ocio.

PAUTAS GENERALES PARA LA EDUCACIÓN DE LAS PERSONAS CON AUTISMO

Obviamente, la naturaleza de los déficits que afecten a una persona ha de llevar a la enfatización de unas u otras intervenciones, así como a la adopción de algunas medidas o apoyos especialmente indicados para dichas personas. En el caso de las personas con autismo, consideramos que los esfuerzos educativos han de tener en cuenta las siguientes pautas:

Intervención sobre el entorno:

Adaptación del entorno a los puntos fuertes de la persona con autismo:
La introducción en el entorno de algunos elementos visuales (miniaturas, fotografías, dibujos, símbolos....) van a permitir a la persona con autismo una mejor comprensión del mismo, así como facilitar sus aprendizajes de aspectos del propio entorno. El uso de pictogramas sencillos en la presentación de actividades de la vida diaria, o en los pasos que componen dichas actividades, y en otras numerosas ocasiones, va a facilitar enormemente la comprensión y la colaboración de la persona con autismo ante dichas actividades. Por ejemplo: presentar a un chico un pictograma de la actividad de juego que se va a realizar, al mismo tiempo que se le nombra, facilitará la comprensión de esta palabra, así como su predisposición para participar activamente en la actividad propuesta. Colocar en su habitación un tablero con los dibujos de los diferentes pasos que el chico ha de seguir para vestirse facilitará el aprendizaje de esta habilidad.
Adaptación del entorno a las limitaciones de la persona con autismo:
Por otro lado, el chico con autismo tiene unas limitaciones que dificultan su desenvolvimiento en los entornos naturales. Durante un período de su vida (variable en función de la gravedad del caso), estas dificultades van a persistir, con unas consecuencias muy negativas en dicho desenvolvimiento, lo cual nos exige que sea el entorno el que se adapte al chico, a sus limitaciones, de forma que esas consecuencias sean lo más leves posibles.
Durante los primeros cinco o seis años de vida, la hipersensibilidad sensorial (auditiva, táctil, olfativa...) que sufren la mayoría de los chicos con autismo hace que estos vivan en un "caos sensorial". Esto produce unas fuertes reacciones negativas del chico, a menudo "inexplicables" para los que le rodean, e incluso un alejamiento consciente de algunas situaciones especialmente estresantes (p.e.: fiestas de cumpleaños, abrazos fuertes...). Ante esto, obviamente los educadores habrán de poner un especial cuidado en reducir o incluso eliminar los estímulos, o situaciones, excesivamente fuertes en todos los entornos en que el chico con autismo ha de estar. En muchas ocasiones, si esto no es posible, dada la naturaleza del entorno (p.e.: una feria ruidosa), se puede optar por paliar dichos estímulos fuertes (p.e.: mediante tapones de cera para oídos), o incluso renunciar por el momento a llevar al chico a dichas actividades.
Otra de las limitaciones del chico con autismo que dificultan su inclusión en entornos naturales es su inflexibilidad ante los cambios, su necesidad de invarianza ambiental. El chico con autismo manifiesta, a partir de una cierta edad mental, una evidente preferencia por el orden y un rechazo ante los cambios imprevistos, una necesidad de que el medio que le rodea sea predecible. La vida en los diferentes entornos naturales, tiene un nivel de estructuración muy variado, lo inesperado, lo espontáneo es, a veces, muy frecuente. Cuanto menor sea esta estructuración, esta predictibilidad, en un entorno, mayores serán las dificultades que el chico con autismo tendrá para desenvolverse adecuadamente en él. El autoaislamiento activo, la no colaboración, el incremento de las actividades repetitivas y las conductas problemáticas, son las principales manifestaciones de dichas dificultades.
Así pues, los educadores habrán de hacer serios esfuerzos por mejorar el nivel de estructuración, de predictibilidad de los distintos entornos. En función de la capacidad del chico con autismo, esta mejora habrá de ser alcanzada mediante métodos más o menos rígidos. Cuando el chico es incapaz de realizar una asociación correcta entre gráficos y sus referentes (objetos, personas, situaciones...), la forma más eficaz de estructurar el medio es la implantación de unas rutinas diarias muy claras. Esto permitirá al chico conocer con anticipación (predecir) las actividades y situaciones en que va a estar próximamente, y disminuirá la probabilidad de aparición de las manifestaciones antes citadas..
En el caso de que el chico con autismo realice correctamente esa asociación gráfico-referente, se podrán utilizar los horarios gráficos y las agendas gráficas. Estos dos instrumentos tienen la cualidad de facilitar la anticipación de lo que va a ocurrir junto con la de poder introducir en las actividades diarias ciertos cambios sin que ello produzca desorientación en el chico con autismo. Asimismo, nos darán la posibilidad de ofrecer al chico diversas alternativas para que elija la que más le apetezca, favoreciendo así su autodeterminación.
Motivación:
otra grave limitación de los chicos con autismo es la escasa o nula fuerza que los motivadores sociales ejercen sobre sus aprendizajes. Entendemos por motivadores sociales aquellos elementos de la interacción social que hacen que las personas, desde la infancia, se esfuercen para lograrlos (una sonrisa, un halago, una palmada, parecerse a un igual, o a un adulto...). Así pues, la búsqueda de consecuencias positivas, inmediatas a los esfuerzos que el chico con autismo realiza en las situaciones de aprendizaje, se convierte en un objetivo prioritario para los educadores. Ciertamente, cuanto más "naturales" sean esas consecuencias reforzadoras, motivadoras, mejor. Una forma de hacer esto es procurando que los aprendizajes que se le proponen al chico con autismo sean, desde el principio, funcionales, es decir, que sirvan al sujeto para solucionar una situación cotidiana, o para obtener un producto claro y atractivo. Otra forma de potenciar la motivación puede ser el uso de actividades preferidas por el chico como agentes reforzadores de otras no tan atractivas para él.
Desarrollo de sus puntos fuertes

Las personas con autismo suelen presentar un desarrollo normal, o incluso superior al normal, en algunas áreas (habilidades visoespaciales, manipulativas, memoria fotográfica, dibujo, música...) Algunas de estas personas tienen gran interés por la letra escrita, o por conocimientos muy reglados (mapas meteorológicos, horarios de trenes, marcas de automóviles...). No obstante, a menudo estas áreas ven alterado su desarrollo a causa de las graves dificultades que surgen en las relaciones entre educador y chico con autismo en el proceso de enseñanza. Otras veces, su preferencia por estas actividades, si no es adecuadamente dirigida por los educadores, puede conducir a actividades repetitivas que dificulten la adquisición de otras nuevas habilidades dentro de esas mismas áreas. Por tanto, una pauta a seguir en la educación de los niños con autismo consistiría en dedicar sistemáticamente parte de los esfuerzos educativos a la evaluación, desarrollo y perfeccionamiento de estas áreas o puntos fuertes. Esto nos permitirá obtener dos objetivos: por un lado, hacer que el chico con autismo experimente una situación positiva de aprendizaje, aprendizaje propuesto por los educadores, y realizado a veces junto a ellos; por el otro, favorecer el desarrollo de habilidades que, en su momento, podrán ser utilizadas por el adulto con autismo para tratar de solucionar algunas situaciones sociales, tratando así de compensar su déficit en inteligencia social. El uso de programas informáticos dirigidos al desarrollo de estas áreas está cada vez más extendido, con unos resultados muy positivos.

Desarrollo de sus áreas deficitarias

Obviamente, los esfuerzos por lograr el mejor desarrollo posible del chico con autismo en aquellas áreas en que su déficit es más importante (interacción, comunicación, imaginación y autodirección) han de ocupar la mayor parte de las situaciones educativas que se diseñen para ellos. El objetivo de esto no estará en la "normalización" del chico en esas áreas, sino en obtener el mejor desarrollo que sus capacidades en estas áreas (la discapacidad no suele ser nunca absoluta) le permitan. El educador (padre, madre o profesor) del chico con autismo habrá de especializarse en el uso de programas dirigidos específicamente a facilitar el desarrollo de habilidades que en la mayor parte del resto de la población infantil surgen y se perfeccionan de manera casi completamente natural. La comprensión de las personas como objetos mentales, la lectura de sus mentes, la intencionalidad comunicativa, el desarrollo de la función declarativa o de comentario, la flexibilidad de las situaciones, el dar sentido a las acciones propias y ajenas, así como la sustitución de objetos o cualidades de éstos durante el juego cotidiano, son algunos ejemplos de estas habilidades de desarrollo "espontáneo" en la población sin autismo. La puesta en práctica de esta pauta frecuentemente produce una "indefensión" de los educadores de los chicos con autismo, producida por el desconocimiento de programas educativos que enfrenten estos objetivos. De modo que la búsqueda y estudio de dichos programas suele ser el primer paso que se sigue de esta pauta.

Uso de entornos naturales

Una de las peculiaridades cognitivas que afectan a los chicos con autismo es la dificultad para generalizar los aprendizajes. Pueden aprender habilidades y conocimientos, incluso actitudes sociales en una situación determinada, pero no utilizarlos en situaciones muy similares. Esto dificulta la generalización de lo adquirido en situaciones de fuerte control (sesiones individuales, aula escolar...) a situaciones naturales. Con el fin de evitar los efectos indeseados de este déficit, resulta aconsejable utilizar, al máximo posible, las situaciones naturales para la enseñanza de habilidades adaptativas propias de dichas situaciones. Entornos tales como la cocina, el cuarto de baño, el supermercado, la piscina, y otros ambientes naturales deberían ser utilizados de forma sistemática por los educadores de chicos con autismo con el fin de incrementar la eficacia de sus esfuerzos educativos.

LA EDUCACIÓN EN LA ESCUELA

Pese a que la escuela no es el único lugar en que la educación del chico con autismo va a ser desarrollada, sí hemos de admitir que es allí donde deben de ser diseñados los programas y actividades educativas que, con posterioridad, habrán de aplicarse por todas las personas que participen de la educación de aquel. Es allí donde habrá de ser evaluado el chico con el fin de determinar sus capacidades y déficits, y corresponde a ella la tarea de recopilar los programas específicos para chicos con autismo, facilitar la formación en ellos de profesores y padres, y proporcionar los medios suficientes para que los educadores del chico con autismo pueda seguir las pautas indicadas para que la enseñanza sea adecuada y eficaz.

Idealmente, los servicios educativos de la comunidad deberían de hacerse cargo, de forma integral, del tratamiento del niño con autismo desde el mismo momento (actualmente alrededor de los 2 ½ años de edad) de su detección y diagnóstico. Una ampliación del currículum de la escuela, desde la etapa infantil, permitiría incluir en él una serie de objetivos actualmente no contemplados en la mayoría de los países occidentales, objetivos referidos a las habilidades básicas de comprensión social, comunicación, imaginación y autodirección.

Esta atención temprana desarrollada por los servicios educativos, de forma conjunta con la familia y otros profesionales, permitiría la implantación de una atención específica intensiva e integral desde el primer momento. Igualmente, esto permitiría una atención adecuada de las necesidades de sus familias, al principio muy extensas y complejas. Ambos hechos son, en la actualidad, considerados como factores importantes de cara al pronóstico sobre la evolución futura del niño con autismo.

Una de las primeras decisiones que la escuela ha de tomar respecto a la educación del alumno con autismo se refiere al grado de restricción/integración en que el mismo ha de ser escolarizado. Esta decisión, naturalmente, habrá de ser tomada junto con la familia del chico, y habrá de tener en cuenta diversos principios o aspectos:

En primer lugar, seguir el principio de escolarizar en el entorno menos restringido posible. Este principio, defendido desde hace tiempo por el programa TEACCH de Carolina del Norte, USA, ha sido asumido progresivamente por numerosos profesionales y familiares a lo largo del mundo occidental, de modo que actualmente pocos lo ignoran. Ahora bien, ¿cuáles son los factores que condicionan esa "posibilidad"?. Podríamos simplificar la respuesta y decir que la capacidad que tenga la escuela para proporcionar al chico los apoyos que éste necesite para ser enseñado es el único factor que la condiciona. En la medida en que la escuela pueda proporcionar los apoyos de personal, material, y adaptaciones curriculares que cada alumno con autismo necesita, la ubicación de éste en un aula con otros chicos de su edad será posible. Concretando más, podemos decir que hay algunas peculiaridades, en el chico con autismo y en el aula escolar, que dificultan frecuentemente la escolarización plenamente integrada del primero. Una escuela carente de recursos materiales y/o humanos, o que siga un currículum cerrado a nuevas necesidades de sus alumnos, o que favorezca la competitividad entre ellos, difícilmente va a resultar un lugar "integrador" para un alumno con autismo. Por otro lado, un alumno que, debido a la intensidad y frecuencia de sus alteraciones conductuales, y a su casi nulo interés social, necesite una gran cantidad de apoyos generalizados y constantes, estará más lejos de poder ser educado en un ambiente no restringido.

Teniendo en cuenta que son muchos los países en los que las escuelas ordinarias carecen, en general, de medios suficientes para ofrecer todos los apoyos necesarios, y considerando que el objetivo principal que se busca al escolarizar a un chico es lograr la mejor educación posible para él, pienso que en numerosas ocasiones la elección de una opción menos integradora pero más eficaz, es preferible frente a una opción integradora pero sin garantías de los apoyos necesarios. De hecho, en mi país, las opciones integradoras más eficaces en la escuela ordinaria están muy directamente relacionadas con el funcionamiento de aulas menos integradoras, pero más específicas y eficaces. Muchos de los chicos y chicas con autismo que están asistiendo en la actualidad a aulas ordinarias han pasado algunos cursos en aulas para alumnos con autismo, y han dado luego el salto a la educación ordinaria, al principio de forma parcial y luego completamente. Los apoyos que reciben en el aula ordinaria son proporcionados, en la gran mayoría de los casos, por los mismos profesionales de las aulas específicas, mediante acuerdos realizados entre los responsables de éstas, generalmente Asociaciones de Padres de niños con autismo, y los de las aulas ordinarias.

EL PAPEL DE LA FAMILIA EN LA EDUCACIÓN DEL NIÑO CON AUTISMO

Como resultará fácil de suponer, por lo dicho hasta ahora, el papel de la familia del chico con autismo en su educación es fundamental. Siendo múltiples las razones que apoyan esta información, vamos a comentar las que nos parecen más importantes:

Por un lado, la naturaleza de los déficits en interacción, comunicación e imaginación hace que éstos se reflejen de una manera continuada en el ambiente familiar. Son numerosísimas las ocasiones en que el chico, dentro de su hogar, debe interactuar con sus padres y hermanos, comunicarse con ellos, o desarrollar actividades lúdicas. Con el fin de evitar la excesiva frustración de los padres al fracasar en estas situaciones, éstos deben de ser parte activa de la educación de su hijo con autismo. Y para ello deberían de ser tan competentes como lo han sido con sus hijos sin minusvalía.

Otra razón de peso es la intensidad y permanencia de las relaciones de los familiares con el chico con autismo (son sus educadores durante todo el tiempo en que no están en la escuela, a lo largo de muchos años de su vida). Esto les hace tener muchas oportunidades para enseñar numerosas habilidades adaptativas funcionales a sus hijos, y en entornos naturales.

Frente a estas dos importantes razones a favor de la participación activa de los padres en la educación del chico con autismo, hemos de reconocer otras dos circunstancias que dificultan, muy frecuentemente, dicha participación: la carencia de formación y la capacidad emocional para aceptar las graves limitaciones que padece su hijo.

De nuevo, la palabra clave para superar estas dos circunstancias negativas es educación. Los padres deben ser formados, educados, para su papel de educadores de un hijo con unas peculiaridades y limitaciones muy especiales. Nuestra experiencia nos indica que una formación adecuada que haga a los padres educadores eficaces de sus hijos con autismo va a facilitar la superación de la segunda de las circunstancias negativas citadas.

Así pues, una formación adecuada y el desarrollo en el hogar, bajo la supervisión profesional, de los programas que pueden ayudar a su hijo pueden hacer de padres y hermanos los educadores más eficaces de los niños y niñas con autismo.

TRATAMIENTO EDUCATIVO DE LOS PROBLEMAS DE CONDUCTA

Una importante aportación del enfoque educativo al tratamiento de las personas con autismo es el enfoque alternativo de los problemas del comportamiento presentados por las mismas (pequeños.y adultos). Las técnicas de modificación de conducta, aplicadas hasta hace unos años han sido fuertementecuestionadas. La base de este cuestionamiento está en la idea expresada por Carr de que "el objetivo de toda intervención debe ser educativo". No se aceptan ya fácilmente esas técnicas que se limitaban a eliminar conductas inadecuadas presentadas por los sujetos en determinadas situaciones. Hablando de las "conductas desafiantes" se pone de aviso acerca de que las conductas problemáticas no son, generalmente, un problema con raíz en las dificultades o alteraciones del sujeto que las presenta, sino que tiene sus raíces en el sistema social que conforman éste y su entorno más cercano.

Este novedoso y altamente gratificante enfoque sobre los problemas de comportamiento tiene su más completa expresión en la obra de Carr Intervención Comunicativa sobre los problemas de Comportamiento, publicada en nuestro país el pasado año 1996. Obra de obligado estudio para todos los educadores de personas que planteen alteraciones conductuales, ya que supone un hito muy importante por la relación que establece entre los problemas de interacción , de comunicación entre las personas gravemente afectadas y su entorno, por un lado, y los problemas de comportamiento que surgen en esos sistemas sociales.

EXPECTATIVAS PARA EL 2.000

Para terminar, me gustaría expresar algunas de las expectativas que, respecto a los programas educativos, albergo de cara al año 2.000.

· Por un lado, la esperanza de que, con el esfuerzo de todos, lleguemos a ofrecer una eficaz respuesta educativa a las necesidades de los chicos y chicas con autismo en el área de la cognición social. Obviamente, es una esperanza limitada a poder desarrollar al máximo las capacidades de estos chicos en ese área, sin pretender "curar su ceguera mental".

· Por otro lado, espero que las técnicas audiovisuales e informáticas puedan ser utilizadas de forma generalizada en el tratamiento de estas personas. No se debe olvidar que dichas técnicas ofrecen dos peculiaridades muy adecuadas a su estilo cognitivo: son básicamente visoespaciales, y altamente previsibles, muy estructuradas.

· Y por fin, tengo la esperanza de que todos los colectivos implicados en la atención educativa a los chicos y chicas con autismo, esto es: familias, asociaciones, administración, colegios, maestros y otros profesionales, realicen un gran esfuerzo para que los importantes problemas de formación que sufren la mayoría de los tutores y tutoras de los alumnos autistas en nuestro país sean superados de la forma más eficaz y rápida posible.



--------------------------------------------------------------------------------

Referencias Bibliográficas

Actas del IV Congreso Nacional de Autismo, Valladolid 1986. (distribuído por la Secretaría de AETAPI)
Actas del VII Congreso Nacional de Autismo El Autismo 50 años después de Kanner (1943). Amarú Ediciones. Salamanca 1993
Actas del VIII Congreso Nacional de AETAPI. Autismo: La respuesta educativa. Ministerio de Educación y Ciencia, CEP de Murcia Y y AETAPI, Murcia 1995
Actas del 5º Congreso de Autismo-Europa La esperanza no es un sueño. Barcelona 1996
Fuentes, J. y otros, Autismo y necesidades educativas especiales. Vitoria-Gasteiz: Servicio Central de Publicaciones del Gobierno Vasco
Jordan, R & Powell, S. Educating those with Autism: from theory into practice. Actas del 5º Congreso deAutismo-Europa. Barcelona 1996
Hernández, Juana Mª, Propuesta Curricular en el área de la comunicación y representación para alumnos con trastornos en la comunicación. CIDE, Madrid 1996
Herrero, J.M.; Hernández, J.M.; y Tamarit, J.; Las necesidades educativas especiales de los alumnos y de las alumnas con autismo o con otras alteraciones graves de la personalidad. La identificación de las necesidades educativas especiales de estos alumnos. Tema 23 del temario de oposiciones de primaria. Editorial Escuela Española. Madrid 1994.
ICAP
Repeto, S. y otros Programa de Habilidades Comunicativas Básicas. Sin publicar. APNA, Pintor Zuloaga, 19, 11010 Cádiz.
Rueda, P.y otros Retraso mental severo y profundo y necesidades educativas especiales. Vitoria-Gasteiz: Servicio Central de Publicaciones del Gobierno Vasco.
Rutter, M. y Schopler, E. Autismo infantil, De. Alhambra, Madrid 1984.
Schaeffer, B.; Musil, A. y Kollinzas, G. Total Communication. A signed speech program for nonverbal childres. Research Pres. Illinois 1980
Schaeffer, B. Lenguaje de signos y lenguaje oral para niños minusválidos. En M.Monfort (de): Investigación y logopedia. CEPE, Madrid 1986.
Schopler, E., y Reichler, G.J. Individualized Assesment an treatment for Autistic and Developmentally Disabled Children. Profile Psychoeducational. University Park Press. Baltimore 1979
Tamarit, J.; DE Dios, J.; Domínguez, S.; y Escribano, L. (1990): PEANA: Proyecto de Estructuración Ambiental en el Aula de Niños Autistas
Tamarit, J. La escuela y los alumnos con grave retraso en el desarrollo. Comunicación, Lenguaje y Educación, 22, 47-35. 1994
Tamarit, J. y Gortázar, P. (en prensa) Entornos: Programa de gestión curricular, Comunidad de Madrid. Madrid
Varios autores Intervención Educativa en Autismo Infantil . Centro nacional de Recursos para la Educación Especial. Ministerio de Educación y Ciencia. Madrid, 1989
Varios autores: La Respuesta Educativa a los Alumnos Gravemente Afectados en su Desarrollo. Centro de Investigación y Documentación Educativa. Madrid 1999

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

INSIDE VISION - Encerramento de incrições

Lamento Informar, mas terminaram os lugares disponiveis para assistirem ao INSIDE VISION.
Fica a garantia de que mais eventos destes iram ser organizados durante o proximo ano.

Agradeço desde ja a todos que se inscreveram (98) e lembro que quem não poder estar presente no Inside Vision sempre podera vir conviver conosco no jantar que se vai realizar a seguir.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Teoria da Mente

ENSINANDO CRIANÇA AUTISTA A LER A MENTE

Um guia prático
"HOWLIN, P.; COHEN, S.B.; HADWIN, J.; Teaching Children With Autism to Mind – Read - A Practical Guide, New York. John Wiley & Sons, 1999."

Neste texto, Baron-Cohen e col. apresentam uma nova forma de trabalho com crianças autistas. De acordo com essa proposta, com uma crianças autistas é mais importante desenvolver a interação social (déficit primário) que trabalhar prejuízos específicos como, ensinar se alimentar independentemente, ensinar atividade acadêmica etc. O texto a seguir procura, de forma simplificada apresentar as idéias gerais do trabalho original de Cohen e col.

HISTÓRICO DO AUTISMO
Inicialmente descrito por Kanner em 1943, o problema básico no autismo, seria um distúrbio congênito no comportamento afiliativo. Desde a proposta da síndrome de Kanner, nos anos cinqüenta, até a noção de síndrome autística nos anos noventa, a conceituação do autismo infantil evoluiu, porém, a classificação e o diagnóstico tem sido objeto de muita controvérsia. O distúrbio autístico instala-se antes dos 36 meses e se apresenta em um contínuo que vai de uma forma mais branda a uma forma mais acentuada, com múltiplas variações. De acordo com a Classificação Internacional de Doenças – CID 10, o autismo infantil é um transtorno global do desenvolvimento caracterizado por: a) um desenvolvimento anormal ou alterado, manifestado antes da idade de três anos, e b) apresentando uma perturbação característica do funcionamento em cada um dos três domínios seguintes: interações sociais, comunicação e comportamento. A desordem é crônica e acomete de 8 a 10 crianças em cada dez mil. Dois terços das crianças autistas permanecem gravemente incapacitadas, 75% dos autistas apresentam comportamentos típicos de deficiência mental, algumas crianças eventualmente podem levar vida independente apenas com sinais mínimos do autismo. Ocorre normalmente em 3 a 4 meninos para cada menina e cerca de 1/3 das crianças autistas desenvolvem convulsões em algum momento da vida.

INTRODUÇÃO
Na tentativa de procurar compreender os mecanismos envolvidos na sintomatologia do autismo, muitas teorias têm sido consideradas. FRITH, 1989 e BARON-COHEN 1984, tem como hipótese, que no autismo, existe um déficit na capacidade de construir "teorias da mente", um déficit na intersubjetividade, que dificultaria não só a compreensão da própria mente como também a compreensão da mente de outras pessoas. Esse déficit na capacidade de construir "teoria da mente" compreende, além de pouca mímica facial, uma aparente dificuldade em entender a mente de outras pessoas. Essas dificuldades na ‘interação social", geraria uma perda nos processos cognitivos do autista.

O QUE É A "TEORIA DA MENTE"
A "teoria da mente" procura explicar a habilidade que as pessoas têm de atribuir os estados mentais a si e aos outros ou seja, procura explicar como uma pessoa atribui a ela mesma e/ou a outras pessoas, as emoções, as crenças os desejos e as intenções/faz de conta. Vejamos alguns exemplos para melhor compreensão.
EMOÇÃO
As crianças normais de 3 anos, são capazes de entender os estados emocionais das outras pessoas, quando estes estados emocionais são causados por alguma situação externa. Ex. Alex não gosta de cachorro bravo. Quando Pedro,(uma criança normal de 3 anos) vê um cachorro bravo correndo atrás de Alex, é capaz de entender que Alex está com medo do cão.

CRENÇA
Por volta de 4 anos, a teoria da mente está melhor desenvolvida e a criança é capaz de "ler a mente" do outro também em situações que envolva uma falsa crença ou seja, crianças de 4 anos podem prever desejos e crenças. Por ex. Alex está esperando um livro de presente, recebe um embrulho mas percebe que alguma outra coisa, que não o livro, está no pacote. Rui que é uma criança normal de 4 anos, observando esta cena, é capaz de perceber o estado mental de Alex, (Alex está triste).

FAZ DE CONTA
Por volta de 5 anos, as crianças normais são capazes de entender outro estado emocional importante que é o faz de conta. Aqui, a criança é capaz de fingir brincar. Ex. Alex é capaz de brincar com uma banana como se fosse telefone, porém não têm dificuldade de reconhecer a real função de ambos os objetos. Isso é uma realização muito complexa.

"LEITURA DA MENTE" NO AUTISMO
Como vimos, esta habilidade de se entender e entender as outras pessoas, ocorre espontaneamente na infância. Um grande número de estudos mostram que, crianças com autismo têm dificuldades no raciocínio sobre os estados mentais e que esta dificuldade contribui para acentuar várias anormalidades que fazem parte de deficiências características da síndrome. No entanto, estes estudos consideram que, o grau de dificuldade para compreensão dos estados mentais vai depender do grau de comprometimento do autismo apresentado. As crianças menos comprometidas não apresentam habilidade para "leitura da mente" na modalidade "Faz de Conta", que é a mais complexa, mas podem apresentar "leitura da mente" na modalidade de "Crença" e "Emoção" que são menos complexas. Sabemos que existe uma estreita relação entre, o desenvolvimento cognitivo ( que é o processo de aquisição de novas habilidades) e a interação social. Sabemos também que, o comprometimento na capacidade para inferir estados mentais ( mentalização) que ocorre no autista, determina seu padrão de interação social, dificultando-o ou impossibilitando-o de prever o comportamento do outro.

LIMITAÇÕES DA ABORDAGEM TRADICIONAL NA INTERVENÇÃO
As intervenções realizadas dentro da abordagem tradicional, procuram trabalhar um prejuízo específico, ou seja, elegem algum comportamento inadequado que é priorizado para tratamento. Tomemos como exemplo uma criança autista que apresenta auto-agressividade, intervir no prejuízo específico significa intervir diretamente no comportamento de auto-agressividade. Segundo nossos autores o sucesso dessa intervenção é limitado porque ela daria a criança apenas o ganho em não apresentar mais aquele comportamento de auto agressividade. Seguindo esse raciocínio, melhor que tentar mudar comportamentos específicos, as intervenções nas crianças autistas devem priorizar o aperfeiçoamento do entendimento social ( que é a limitação básica desta população).

ENSINANDO CRIANÇA AUTISTA A "LER A MENTE"
O objetivo principal de BARON-COHEN e col. neste manual é "trabalhar" as incapacidades sociais e de comunicação (déficit primário) que são os principais itens que dificultam os processos da aquisição de novas habilidades. Este "trabalho" consiste em habilitar essas crianças a um melhor desempenho nas interações sociais de forma que seu melhor desempenho contribua na redução de problemas secundários. Falando de outra forma: existe no autismo uma incapacidade de atribuir estados mentais às pessoas e essa incapacidade gera vários comportamentos também inadequados e o trabalho terapêutico básico é de desenvolver a capacidade para a interação social, (ensinando literalmente a criança a "leitura da mente"). É importante ressaltar que, este treinamento é mais indicado para crianças com nível de comprometimento autístico de leve para moderado.

OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO ENSINAMENTO
Considerar a seqüência normal do desenvolvimento
: A seqüência de ensinamento é baseada no conhecimento prévio sobre o "desenvolvimento normal dos estados mentais" em pessoas normais. Sabe-se que a criança aos 3 anos, consegue atribuir estados mentais aos outros na modalidade da emoção, em seguida, aos 4 anos consegue na modalidade de desejos e crenças e, finalmente, aos 5 anos, consegue elaborar situações de faz de conta.
O ensinamento da "leitura da mente" é iniciado partindo do repertório apresentado ou seja, após avaliar o nível em que a criança se encontra e seguindo o processo do desenvolvimento normal. O ensinamento deve ser dividido em pequenos passos e de utilizar a repetição de tarefas. Observou-se que as tarefas não treinadas, mesmo quando semelhantes, são de aquisição limitadas ou seja, a generalização não ocorre com facilidade. Para superar a falha na generalização, é sugerido que ensinar os "conceitos". Os autores verificaram que:
Ensinar os conceitos é mais efetivo que passar simples "instrução",

Quando o ensinamento é feito no ambiente natural os resultados são mais eficientes, principalmente, quando são utilizados brincadeiras, computadores, gravuras e jogos.

Elogios e incentivos devem ser dados em todos os momentos.

Os comportamentos que são sistematicamente reforçados serão adquiridos mais rapidamente e mais provavelmente serão mantidos que os não reforçados deste modo.

Se são cometidos erros , a criança deve ser imediatamente corrigida.

É muito importante
evitar o aprendizado errado.

Para minimizar a complexidade das tarefas, o entendimento de estados mentais foi dividido em 3 modalidades separadas:
Entendimento de emoção dado uma situação externa.

Entendimento de emoções dado uma crença.

Entendimento de situações de "faz de conta".

Os conceitos foram ordenados em 5 níveis sucessivos de complexidade sendo o nível 1 o mais simples e o nível 5 o mais complexo. Exemplo desses estágios são apresentados na Tabela 1.
Tabela 1 – Os 5 níveis do ensinamento do estado mental
Emoção CrençaFaz de conta/Ficção
Nível 1Reconhecimento da fotografia facial (bravo/ com medo / feliz/ triste) Reconhecimento de perspectiva simplesJogo sensório-motor
Nível 2 Reconhecimento esquemático facial (bravo/ com medo / feliz/ triste)Reconhecimento de perspectiva complexaBrincadeira funcional
(< =2 exemplos)
Nível 3Emoções baseadas em situações (bravo/ com medo / feliz/ triste)Observação de pistas para entendimento (eu/ outro)Brincadeira funcional
(> 2 exemplos)
Nível 4Emoções baseadas em desejos (feliz /triste)Crença verdadeira/ predição de ação Fingir brincar
(<= 2 exemplos)
Nível 5Emoções baseadas em crenças (feliz /triste)Falsa crença fingir brincar
(> 2 exemplos

O trabalho é sempre realizado a partir de uma determinada modalidade (emoção, crença ou faz de conta) de acordo com o nível de desenvolvimento apresentado pela criança, percorrendo todos os níveis da modalidade trabalhada. Inicia-se avaliando pelo nível 1 da modalidade emoção, em seguida nível 2, 3, 4 e finalmente o 5 da modalidade emoção. Após avaliação e trabalho no nível 5 passa-se para a modalidade seguinte percorrendo sempre a seqüência dos níveis.
Vejamos alguns exemplos:
EMOÇÃO
Nível 1
Reconhecer expressões faciais ( emoções) em fotografias
Iniciamos pela avaliação do reconhecimento de emoções no outro. Primeiro vamos verificar se a criança é capaz de reconhecer, através de fotografia facial as expressões das quatro emoções: bravo, com medo, feliz e triste. Apresente as quatro fotografias para a criança.

Diga: Agora iremos olhar algumas rostos que nos mostram como as pessoas se sentem.
Pergunte: Pode me mostrar a rosto feliz?
Falando de outra forma: Mostre-me onde está a pessoa feliz.

Se a criança falhar ao reconhecer alguma das quatro emoções mostradas nas fotos, comece a ensinar a partir deste nível.
Procedimento de ensinamento
Pedir a criança para identificar as quatro fotos de expressões faciais de emoções bravo, com medo, feliz e triste.
O terapeuta primeiro coloca as fotos na mesa e nomeia as emoções mostradas em cada uma delas. Depois é pedido para fazer caras semelhantes às mostradas pelo ( terapeuta).
Vamos colocar a quatro rostos aqui. Essa é brava, com medo feliz, triste.
Eu tenho mais algumas rostos para você olhar. Você pode colocá-las junto com as que se parece com elas?
Esta é brava. Onde devemos colocar a rosto brava?
Sim, está certo. Esta é a rosto brava também! Etc.
Se a criança comete algum erro, ela é interrompida e a resposta correta é apresentada. Após a criança ter adquirido a habilidade para reconhecer emoções apresentadas nas fotografias passa-se para o nível seguinte de complexidade que é o reconhecimento das emoções através dos esquemas faciais/desenhos das rostos.
A seqüência de procedimento é a mesma.

Nível 2:
Reconhecimento de (Emoção) através de esquema/desenho facial
Inicialmente vamos avaliar se a criança tem capacidade para reconhecer as emoções: feliz, triste, bravo e com medo através dos desenhos/esquemas faciais. Apresente os quatro desenhos para a criança.

Diga: Agora iremos olhar alguns desenhos que nos mostram como as pessoas se sentem.
Pergunte: Pode me mostrar o desenho da rosto feliz?
Falando de outra forma: Mostre-me onde está o desenho da rosto feliz?
Se a criança falhar ao reconhecer alguma das quatro emoções mostradas nos desenhos/esquemas, comece a ensinar a partir deste nível.
Procedimento de ensinamento
Pedir a criança para identificar as quatro expressões de emoções (bravo/ com medo/ feliz/triste) trocando-as.
O terapeuta primeiro coloca os desenhos na mesa e nomeia as emoções mostradas em cada uma delas. Depois é pedido a criança para fazer caras semelhantes às apontadas pelo terapeuta.

Vamos colocar os quatro desenhos aqui. Essa é bravo, com medo, feliz, triste. Eu tenho mais algumas rostos para você olhar. Você pode colocá-las junto com as que se parece com elas?
Esta é feliz. Onde devemos colocar a rosto feliz?
Sim, está certo. Esta é a rosto feliz também! Etc.
Se a criança falha em reconhecer alguma das quatro emoções mostrada nos desenhos comece a ensinar a partir deste nível.
Nível 3
Identificando emoções baseadas em situações
Inicialmente vamos avaliar a capacidade que a criança tem de identificar emoções baseadas em situações. São emoções desencadeadas por situações ( ex.: medo quando um acidente está para acontecer). Neste nível a criança deve ser capaz de prever como a personagem se sentirá a partir da situação mostrada.
Apresente para a criança um cenário com as quatro rostos desenhadas. A criança precisa interpretar o contexto social e emocional da figura e prever com que expressão facial a personagem deve estar. As situações indicam braveza, com medo, feliz e triste. Algumas vezes existe a possibilidade de duas respostas plausíveis ( ex.: algumas histórias tristes podem também indicar uma resposta brava, neste caso, prevalece a interpretação do terapeuta.
Situação: Um cachorro grande corre atrás do menino.
Apresente a figura à criança.
Diga:
Veja, o cachorro está correndo atrás do menino.
Pergunta de emoção:
Como o menino se sentirá com o cachorro correndo atrás dele?
Ele se sentirá feliz, triste, bravo ou com medo?
Aponte para uma das rostos desenhadas.
Vamos ver como o menino se sente.
A criança pode apontar uma expressão.
Veja, o menino está com medo.
Pergunta justificativa:
Porque ele está com medo?
Pergunta justificativa: Tem como objetivo obter informações se a criança consegue explicar a razão daquele sentimento.
Se a criança errar a resposta de emoção e justificativa sem indução de qualquer das quatro histórias que você escolheu, comece a ensinar neste nível.
Os procedimentos de ensinamento, repetem os anteriores.
Para avaliar emoções baseadas em situações, pegue uma história de cada uma das emoções listadas a seguir (ex.: 4 em todos). Os exemplos seguintes ilustram como administrar as histórias.

Nível 4
Identificando Emoções baseadas em desejos
Estas são as emoções causadas pela satisfação ou não dos desejos de uma pessoa. Nesse nível a criança deve ser capaz de identificar os sentimentos da personagem (feliz ou triste) de acordo com a satisfação ou não do desejo.
Materiais e Procedimentos de avaliação
Algumas figuras mostrando expressões faciais e várias situações emocionais. A criança precisa interpretar um desejo, frente a um contexto social e prever a expressão emocional que a personagem deve estar. As situações indicam felicidade ou tristeza.
A avaliação de emoção baseada no desejo.
Para avaliar a capacidade de "ler a mente" de acordo com o desejo, apresentar situações onde é informado para a criança, qual o desejo do personagem, em seguida, qual a ação recebida. Apresentar situações onde a ação recebida, atende o desejo do personagem , e situações onde a ação recebida não atende o desejo do personagem. Depois de descrever as figuras da história pergunte à criança como o menino (personagem) se sente. Feliz ou triste?"
Desejo
Situação: O menino quer passear de trem.
Figura 1:
Veja. Esse é o menino. Esta figura mostra o que o menino quer. Ele quer passear de trem.
Figura 2: Veja o pai do menino. Ele levou o menino para passear de trem.
Pergunta:
O que o menino queria?
Orientação: Veja, isso nos fala o que ele quer. Aponte para o pequeno desenho de desejo que está dentro da figura 1.
O que o menino quer?
Pergunta de emoção:
Como o menino se sentirá quando o pai o levar para passear de trem. Você pode apontar para a expressão do menino?
Orientação: Ela se sentirá feliz ou triste? Aponte para
cada uma das rostos enquanto fala.
Me fale como o menino se sente.
Deixe a criança apontar a rosto correta.
Veja,
se não houver resposta ou a resposta for incorreta, proponha: O menino está feliz.
Pergunta do Porque
: Porque ele está feliz?
Se a criança falhar na previsão da emoção em uma ou mais histórias, das selecionadas, comece a ensinar nesse nível.
Procedimentos de ensinamento
Estas tarefas testam a habilidade da criança de prever o sentimento da personagem (feliz/triste) dependendo se o desejo foi realizado ou não. O terapeuta mostra à criança a cena na primeira figura (ilustra o que a personagem quer). Depois o terapeuta descreve a segunda figura (ilustra o que aconteceu). Em seguida o terapeuta pergunta o que a personagem quer, e como ele se sentirá, propondo as duas alternativas possíveis (feliz/triste). A criança aponta para a expressão. Se a resposta é correta o professor reforça a resposta e o entendimento da criança, perguntando: "Porque ele está feliz/triste" etc. Se a resposta for incorreta, a resposta correta é dada, assim como a razão para o sentimento.
Princípio geral de ensinamento
Se correto ou incorreto, a criança é sempre provida com o princípio geral de ensinamento sublinhando aquela emoção.
Quando você consegue algo você quer, você se sente feliz.
Se você não consegue o que você quer você se sente triste.
Nível 5
Identificando emoção, baseado em crença
.
Essas são emoções causadas pelo que alguém pensa que é a verdade, mesmo se, o que eles pensam, conflita com a realidade. É pedida a criança para seguir uma seqüência de três figuras e para prever a emoção que a personagem do desenho ira experimentar de acordo com o que elas acreditam que seus desejos foram ou não satisfeitos
Materiais e procedimentos de avaliação
Existem figuras para demonstrar cada uma das histórias de emoções baseadas em crenças. A primeira figura mostra a realidade da situação. A segunda figura mostra a personagem, e duas figura menores que demonstram o que a personagem quer ( desejo) e o que ela pensa que vai conseguir (crença). A figura final mostra o resultado do acontecimento. Tendo em vista o resultado do acontecimento, dois desenhos/esquemas de rostos são usadas para a criança apontar a expressão que indica a emoção do personagem, frente a situação do acontecimento. As expressões indicam felicidade ou tristeza.
ENSINANDO SOBRE ESTADOS INFORMACIONAIS
Os autores propõem também, ensinar os estados informais que incluem a percepção, o conhecimento e a crença. Estes ensinamentos são também divididos em 5 níveis conforme descrevemos abaixo.
Nível 1, perspectivas visuais simples:
Esse é o entendimento que, pessoas diferentes podem, em perspectivas diferentes, ver coisas diferentes. Nesse nível, a criança deve julgar o que o terapeuta pode ver e o que não pode ver.
Materiais e procedimentos de avaliação:
Cartões com figuras diferentes.
Pegue dois cartões com figuras diferentes e coloque entre o terapeuta e a criança de forma que uma figura fique de frente para a criança e a outra de frente para o terapeuta.
Questão da própria percepção:
"O que você pode ver?"
Questão da percepção do outro:
"O que eu consigo ver?"
Para a pergunta da própria percepção a criança deve simplesmente dizer qual o objeto na sua frente. Para a pergunta da percepção do outro a resposta correta, é claro, deve referir a figura do lado do cartão em que está o terapeuta.
Exemplo:
Pegue um cartão (ex. bolo/bule) entre você e a criança
Pergunta da própria percepção: "O que você vê?"
Pergunta da percepção do outro
: "O que eu posso ver?" (lembre-se de variar a ordem de eu/você)
Ensinando:
Pergunta da percepção do outro: Para uma resposta incorreta:
Você pode ver um bolo, não pode? O bolo está no seu lado do cartão.
Aponte para a figura do lado da criança.
Mas veja! O que está no meu lado do cartão? O que eu posso ver?
Mostre à criança o outro lado do cartão.
Certo. Eu vejo o bule.
Vire o cartão de modo que a criança veja o bolo de novo.
Eu não posso ver o bolo, só você pode ver o bolo.

Se a resposta for correta o terapeuta reforça a criança, se a resposta for incorreta, a resposta correta é ensinada assim com o princípio geral do ensinamento.
Pessoas nem sempre vêem as mesmas coisas, e o que elas vêem
dependerá de sua posição, etc.

Se a criança falhar nos testes, comece a ensinar deste nível.
Nível 2
Entendimento de perspectivas visuais complexas
Este nível envolve o entendimento não apenas do que a pessoa vê mas de com isso aparece para elas.
Materiais e procedimentos
Selecione algumas figuras que são de interesse para a criança. Coloque um cartão com a figura entre o terapeuta e a criança de forma que, a figura aparece em pé para a criança e de cabeça para baixo para o terapeuta. Ex. sendo a figura a de um elefante, o elefante aparece de cabeça para cima para a criança e de cabeça para baixo para o terapeuta.
O terapeuta pergunta para a criança:
Pergunta da percepção do outro:
"Quando eu olho para a figura, está [o elefante] em pé, ou de cabeça para baixo?"

Procedimento de ensinamento:
O terapeuta pergunta à criança sobre a posição de um objeto que cada um vê de uma forma:
Exemplo: Coloque o cartão (ex. Mikey Mouse) na mesa entre a criança e o terapeuta, de modo que o objeto apareça de uma forma para um e de outra forma para o outro. Depois pergunte à criança:
Pergunta da percepção do outro: "Quando eu olho nesta figura, está o Mikey de pé, ou de cabeça para baixo?" (varie a ordem da escolha).
Ensinando
Questão da percepção do outro: (para uma resposta incorreta)
Veja, quando você olha para o Mikey, ele está de pé. Mas quando eu olho para o Mikey ele está de cabeça para baixo. Veja o que acontece quando eu viro o cartão ao contrário.
Vire o cartão de modo que o Mikey fique de cabeça para baixo para a criança e para você ele fique de pé.
Agora quando eu olho para o Mikey ele está de pé, mas quando você olha ele está de cabeça para baixo.
Outro método de ensinamento que pode ser utilizado é manter a figura na mesma posição e a criança e o terapeuta trocarem de lugar para a criança ver as diferentes perspectivas.

Se a resposta for correta o professor reforça o entendimento da criança perguntando "porque", se a resposta for incorreta, a resposta correta é dada, assim como o principio geral do ensinamento.
Pessoas podem ver a mesma coisa de diferentes formas.

Se a criança falhar nos testes, comece a ensinar deste nível.
Nível 3
Entendendo o princípio que "ver leva ao saber".
Este nível testa a habilidade de entendimento da criança que pessoas só sabem "das coisas", que elas tiveram experiência (direta ou indiretamente).
Materiais e procedimentos de avaliação:
Caixas, boneca ou marionete, objetos diferentes apenas em tamanho, outros em cor etc.
A avaliação do nível 3 deve incluir um exemplo de cada uma das seções e mais um exemplo adicional..
Vamos brincar de um jogo de esconder com estas caixas.
Veja esses lápis. Esse lápis é grande e esse lápis é pequeno.
Eu vou esconder um dos lápis nesta caixa. Você pode fechar os seus olhos para não ver qual eu coloquei dentro dela?
Coloque o lápis grande na caixa.
Pergunta de conhecimento
: Você sabe qual lápis está na caixa? [não]
Pergunta justificativa
: "Porque você não sabe qual lápis está na caixa?" [Porque eu não vi, etc.]
Procedimento de ensinamento:
O terapeuta esconde o objeto, de modo que a criança não possa ver, depois pergunta à criança, a respeito do objeto. Se a resposta for incorreta, a resposta correta é dada, assim como o princípio geral do ensinamento.
Pessoas apenas sabem de coisas que ela viram. Se elas não podem ver algo, então elas não sabem sobre aquilo.
Nível 4
Prevendo ações com base no conhecimento das pessoas
Este nível testa o entendimento da criança de que, as pessoas podem Ter crenças verdadeira. Neste nível, é pedido às crianças para prever ações com base em onde uma pessoa acredita que um objeto está.
Materiais e procedimentos de avaliação: uma casinha de brinquedo, quarto, locais para colocar objetos.
Exemplo: Vamos jogar com esta casa e João.
Veja, tem uma bola na cama e tem uma bola na mesa.
Aqui está João, esta manhã João viu a bola na cama. João não viu a bola na mesa.
Aponte apropriadamente.
Questão de ação
: Onde João vai procurar a bola?
Pergunta Justificativa
: Porque ele pensa que ela está na cama?
Pergunta de verificação
: Onde João viu a bola?
Ensinando
Pergunta de ensinamento: Para uma resposta incorreta.
Lembre-se, João viu a bola na cama, então João procurará a bola na cama.
João não viu a bola na mesa, então ele não olhará lá.
Se a resposta estiver correta o terapeuta reforça a criança e conduzirá ao entendimento perguntando "porque"?
Se a resposta for correta ou incorreta, a criança é sempre lembrada do princípio geral do ensinamento sublinhando a crença:
Pessoas pensam que as coisas estão onde eles as viram. Se eles não viram então eles não saberão que elas estarão lá.
Nível 5
Entendendo falsas crenças
Nesse nível, devemos avaliar a habilidade da criança entender que pessoas podem adquirir falsas crenças.
Materiais e procedimentos de avaliação: uma casinha de bonecas com mesa, marionetes, armários, bolas, etc.
Vamos brincar com Maria.
Veja, Maria tem uma moeda.
Aqui estão dois porta níqueis, um preto e um vermelho.
Maria pôs sua moeda no preto.
Maria está saindo para brincar agora.
Maria sai do quarto.
Maria saiu. Ela não pode ver o que estamos fazendo.
Vamos fazer uma brincadeira com Maria? Iremos tirar a moeda da bolsa preta e colocá-la na verde.
Pergunta de crença
: Aqui está Maria de volta do parquinho. Onde ela acha que a moeda está? (na bolsa preta)
Pergunta Justificativa:
Porque Maria pensa que a moeda está na bolsa (preta)?
Se a resposta estiver correta o terapeuta reforça a criança e conduzirá ao entendimento perguntando "porque"?
Se a resposta for correta ou incorreta, a criança é sempre lembrada do princípio geral do ensinamento sublinhando o princípio geral do ensinamento:
Se a pessoa não sabe que coisas mudaram então elas pensarão que elas continuam do mesmo modo.
Os autores constatam que mudanças significativas foram encontradas. Depois de um breve período de treinamento, mudanças significativas ocorreram nas áreas específicas que foram selecionadas. Esses aperfeiçoamentos foram mantidos um bom tempo depois do fim da intervenção. Acredita-se que um maior período de treinamento, junto com as famílias e professores, podem realçar a eficácia dos métodos usados.
Tradutora / Autora do texto:
Maria Isabel Pinheiro
Professora do Departamento de Psicologia – Universidade Federal da UFMG
Ano: 2000

BIBLIOGRAFIA
HOWLIN, P.; COHEN, S.B.; HADWIN, J.; Teaching Children With Ausism to Mind – Read - A Practical Guide, New YorkJohn Wiley & Sons, 1999.
COHEN, S. B.; Mindblindness, Massachusetts Institute of Technology, Third printing, 1996.

Jantar Inside Vision - 25 Outubro as 21h00

Apos ter um grande numero de inscritos (neste momento 80), achei que seria a altura ideal de todos nos conhecermos um pouco melhor e estar informalmente com os convidados. Por este motivo estou a abrir inscrições para um jantar de convivio entre os participantes as 21h00 no Restaurante Viveiros da Mauritanea em Leça da Palmeira (frente a piscina), infelizmente não consegui apoio para este jantar pelo qual teram no acto de inscrição fazer o pagamento da mesma. Em seguida passo a informar preços, menu e dados bancarios para efecturarem o pagamento:



Pão, Manteiga, Croquetes de vitela, Rissóis de marisco, Bolinhos de bacalhau, Salpicão parolo.

Aperitivos líquidos: Martini, Favaios, Refrigerantes, Cerveja.


Melão c/ Presunto
***

Bacalhau a Mautitanea
Ou
Posta de Novilho Laminada ( Mirandesa )

Sobremesa: Tarte gelada de bolacha, Pudim Francês, Delicia de Chocolate, Salada de Frutas.
Bebidas: Agua, Refrigerantes, Vinhos da Casa, verde ou maduro.
Café

Preço por pessoa: 20,90 Euros

Nib para pagamento:

Millenniumbcp
0033 0000 00049260288 02

Os recibos serão entregues durante o jantar a quem pretender.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Sessão de inauguração do nono curso de Mestrado em Educação Especial

Caros Membros

Aproveitamos para lembrar todos os membros que no dia 24 de Outubro pelas 14h30 haverá na Faculdade de Motricidade Humana uma sessão de inauguração do nono curso de Mestrado em Educação Especial. O orador principal é o Dr. Kenneth Eklindh, responsável na UNESCO pela coordenação dos projectos de Educação Inclusiva. A conferência vai ser proferida em inglês e seguida de um debate. Haverá apoios para a tradução. Todos são convidados a estar presentes,

Mas é preciso que não se esqueçam de confirmar a presença para fsoares@fmh.utl.pt.

Informamos que por lapso, no nosso último InforFEEI, o endereço electrónico da Associação Nacional de Docentes de Educação Especial estava incorrecto pelo que apresentamos as nossas desculpas e procedemos à referida correcção:

... dos outros!...

PRÓ-INCLUSÃO

Um grupo de Professores de Educação Especial constituiu em Julho uma Associação denominada Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial.
Esta Associação vem colmatar uma falta que há muito se fazia sentir ao nível da representação profissional dos professores de Educação Especial.
Como objectivos a curto prazo a Pró-Inclusão tenciona editar uma revista de carácter eminentemente profissional e realizar um congresso internacional de Educação Especial no primeiro semestre de 2009.
O Fórum de Estudos de Educação Inclusiva, saúda o aparecimento desta Associação que irá certamente contribuir para o desenvolvimento profissional dos professores de Educação Especial. O Fórum continuará o seu trabalho que sempre se assumiu como inter-profissional e recolhendo e agregando contributos de variadas proveniências.

Para os interessados o endereço electrónico da Pró-Inclusão é:
proandee@gmail.com

Saudações inclusivas
La Salette Arcas




Fórum de Estudos de Educação Inclusiva
Prof. Doutor David Rodrigues

Coordenação

Dr.ª. La Salette Arcas
Secretariado/Apoio


CONTACTOS
F E E I
Faculdade de Motricidade Humana
Departamento de Educação Especial e Reabilitação
Quinta da Graça – Estr.da Costa
1499-688 - Cruz Quebrada
Portugal
(++351) 214.149.156
feei@fmh.utl.pt www.fmh.utl.pt/feei

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

INISIDE VISION - Alteração de sala

Devido ao elevado fluxo de pedidos inscrição no Inside Vision e a capacidade da sala do Hotel AC Porto ja se ter esgotado levou me a alterar o local para o seguinte Auditorio:

Anfiteatro do Ensino Pré-Graduado do Ex-Cicap do Hostpital Geral de Santo Antonio, na Rua D. Manuel II (Ex Edificio da Reitoria do Porto) em frente ao Museu Soares dos Reis e ao lado do Palacio de Cristal.

Apartir deste momento continuam as inscrições abertas, para alguma duvida e esclarecimento os contactos são insidevision.opo@gmail.com e o telemovel 969702046.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Neurodiversidade

Nada sobre nós sem nós: Os estudos da deficiência e a retórica anticura

Para compreendermos o surgimento do movimento chamado de "neurodiversidade" devemos nos remeter ao campo dos chamados ‘estudos da deficiência’ (disability studies), os quais, nas últimas décadas, vem desenvolvendo uma área de reflexão sobre a deficiência (disability) que escapa ao discurso de médicos, educadores e especialistas diversos. O discurso acadêmico sobre a deficiência surge como posicionamento crítico sobre o discurso dos especialistas. Como se deduz do lema dos ‘estudos da deficiência’: "nada sobre nós sem nós" (nothing about us without us), o movimento é composto basicamente por pesquisadores ‘deficientes’ (disabled). Essa situação se repetirá, como veremos mais adiante, entre os idealizadores do movimento de Neurodiversidade, composto basicamente por autistas, especificamente os chamados ‘Aspies’ (em referência aos portadores da síndrome de Asperger). O campo acadêmico dos estudos da deficiência surge no mundo anglo-saxão no fim dos anos setenta do século passado, coincidindo com o movimento antipsiquiátrico, o surgimento do feminismo organizado e dos movimentos de raça, tais como o black power. Desde sua constituição, a área dos estudos da deficiência tem efetuado um deslocamento desde uma abordagem marxista inicial no começo dos anos setenta, ligada à redescoberta da obra de Gramsci no Reino Unido, para posições mais recentes próximas do pós-estruturalismo e do construtivismo social. Trata-se de um deslocamento

1 Francisco Ortega, "Il soggetto cerebrale ed la sfida della neurodiversità", In Barbetta, Pietro (Org) Frontiere di giustizia e psicoterapie, Roma, Neltemi (No prelo). A idéia geral deste texto foi apresentado no evento Il self e la sua ombra. Frontiere di giustizia e psicoterapie, realizado na Università degli Studi de Bergamo, Itália, nos dias 22 e 23 de Janeiro de 2007. Agradeço especialmente a Pietro Barbetta, Enrico Valtellina, Gabriella Erba e Michelle Capararo pelos comentários e observações realizados. Sou grato também a Rafaela Teixeira Zorzanelli pela leitura atenta do manuscrito e pelos comentários pertinentes.

2 Muskie, criador do site do Institute for the Study of the Neurologically Typical, http://isnt.autistics.org

3 Dedicatória do livro de Susanne Antonetta, 2005.

4 Arrabal, Fernando, 2007: 33.

2

análogo aos efetuados nas áreas de gênero, sexualidade e raça, nas quais os estudos da deficiência se inspiram.

Em 1975 a Union of the Physical Impaired against Segregation (UPIAS), publica um texto seminal, Fundamental Principles of Disability, que lançará as bases do chamado ‘modelo social da deficiência’ (social model of disability). A novidade teórica fundamental é a divisão entre "invalidez (impairment) e "deficiência" (disability). Enquanto a primeiro remete à condição física da pessoa, a deficiência por sua vez faz referencia a um vínculo imposto por uma sociedade sobre o indivíduo considerado inválido: "Nossa posição acerca da deficiência é bastante clara e coerente com os princípios acordados. Na nossa opinião, é a sociedade que desabilita pessoas com alguma invalidez física. A deficiência é algo imposto sobre a invalidez. A propósito, nós somos desnecessariamente isolados e excluídos de uma participação completa na sociedade. Por isso, pessoas com deficiências constituem um grupo oprimido na sociedade" (UPIAS, 1975). A dicotomia ‘invalidade/deficiência’ (impairment/disability) é construída de maneira análoga à dicotomia ‘sexo/gênero’, sendo o primeiro um atributo biológico e o segundo uma construção social (Corker e French, 1999b).

Basicamente, o modelo social da deficiência surge como alternativa ao modelo hegemônico médico-individual com sua ênfase no diagnóstico e que constrói o indivíduo deficiente como sujeito dependente. Mike Oliver (1990) denomina esse modelo de "modelo da tragédia pessoal". Para os teóricos do modelo social, a deficiência não é uma tragédia pessoal; é um problema social e político (Davis, 2000). Ela não existe para além da cultura e do horizonte social que a descreve como tal e nunca pode ser reduzida ao nível biológico e/ou patológico. Para eles, só existem atributos ou características do indivíduo considerados problemáticos ou desvantajosos em si por vivermos em um ambiente social que considera esses atributos como desvantajosos. Assim, por exemplo, andar de cadeira de rodas é um problema apenas por vivermos em um mundo cheio de escadas, e consideramos deficientes indivíduos que não olham nos olhos quando se comunicam, como é o caso dos autistas, apenas por que nossa sociedade estabelece o contacto visual como um elemento básico da interação humana (Young, 2004; Antonetta, 2005).

Nos últimos anos, a ‘virada lingüística’ (linguistic turn) chegou também aos estudos da deficiência, com a incorporação das teorias pós-estruturalistas e a construção discursiva da deficiência (Corker and Shakespeare, 2004a; Corker and French, 1999a). A influência de autores como Derrida e Foucault no campo permite compreender como a normalização pressupõe a deficiência para sua própria definição: o indivíduo só pode ser considerado ‘normal’ por oposição ao indivíduo considerado ‘inválido’. A deficiência aparece como construção cultural que implica o estatuto ‘natural’ do ‘normal’. Mas do que um fato biológico, constitui uma maneira de regulamentar os corpos considerados normais e corresponde à recusa da sociedade em aceitar a variabilidade do corpo humano. Por outro lado, embora a invalidade fosse ‘real’ antes dos discursos médicos, científicos, psiquiátricos e jurídicos sobre ela, a proliferação desses discursos possibilitou o surgimento da deficiência, a qual não existia antes desses discursos. (Corker, and Shakespeare, 2004b). Nesse sentido, um dos teóricos mais representativos dos estudos da deficiência, Lennard Davis (1995: 51), faz no livro Enforcing Normalcy a chocante afirmação de que "Europa tornou-se surda durante o século XVIII". Para o autor, a deficiência é um processo social que corresponde a uma maneira hegemônica de pensar sobre o corpo, a qual alcançou uma relativa organização por volta do século XVIII. Antes dessa data, existiam obviamente

3

pessoas surdas e seus familiares, mas não existiam discursos nem políticas públicas sobre e para a surdez, assim como não havia nenhum tipo de instituições educacionais para surdos. Como conseqüência, os surdos não eram constituídos como um grupo. Só após a introdução das políticas e instituições educacionais para surdos (os quais, tendo a maioria nascida de pais que ouviam, não se viam a si mesmo como parte de uma comunidade), eles são constituídos como grupos, desenvolvendo um senso de comunidade, um subgrupo ou comunidade étnica no meio da nação.

Surge então um nacionalismo surdo como resistência à ‘cultura ouvinte’ (audist culture), que contesta o que Davis define como um dos mitos fundacionais da ‘cultura indeficiente’ (ableist culture), qual seja, acreditar que a norma entre os seres humanos é ouvir e falar, comunicar-se por médio de fala e audição. No século XIX, os surdos eram considerados estrangeiros vivendo nos Estados Unidos, e movimentos de surdos organizados cogitaram fundar um estado de surdos no oeste do país. Jane Elizabeth Groom propôs nos anos de 1880 que os surdos deixassem a Inglaterra e criassem um estado de surdos no Canadá (ibid., 84-5). Esses exemplos testemunham que os surdos se viam como uma comunidade étnica, uma minoria lingüística convivendo dentro do mesmo país. Na atualidade, o movimento surdo reivindica o senso de comunidade, considera-se um subgrupo lingüístico convivendo com outras minorias lingüísticas (latinos, italianos, entre outros, no caso dos Estados Unidos) que tem que ser respeitada. Isso tem conduzido em alguns momentos a uma certa tensão com os movimentos de deficientes por não considerarem a surdez como uma deficiência. Os surdos "sentem que sua cultura, linguagem e comunidade os constituem como uma sub-nacionalidade, totalmente adequada, fechada em si mesma, auto-definidora dentro de uma estrutura maior do estado ouvinte" (Ibid., xiv). Como conseqüência, numa época em que o screening fetal torna-se cada vez mais nossa realidade, abortar uma criança que sabemos que nascerá surda seria para eles análogo a abortar uma criança por falar espanhol, chinês, ser negra ou homossexual. Evidentemente esses casos nos parecem chocantes e são repudiados pela maioria das pessoas. Mas, e se se coloca a questão da possibilidade de abortar uma criança com síndrome de Down, ou que vai nascer sem algum membro, ou ser autista, isto é, casos nos quais um número maior de pessoas mostraria uma inclinação para o aborto? Aí a questão fica mais complexa como veremos mais adiante no caso do autismo. Por outro lado, é possível pensar em situações em que pais surdos de nascença decidissem abortar fetos se soubessem que nasceriam ouvintes, de maneira semelhante ao que já está acontecendo no caso de pais de crianças surdas de nascença envolvidos em querelas judiciais exigindo que não seja realizado um implante coclear nos seus filhos. O aumento da consciência dos surdos (e de outros ‘deficientes’) pode levar e está levando a tornar realidade essas possibilidades (Elliot, 2003).

O exemplo dos surdos é muito significativo para entender o movimento da neurodiversidade, como será mostrado mais adiante, o qual, em muitos aspectos assemelha-se ao movimento surdo. A tomada de consciência desse movimento (e de deficientes em um sentido mais genérico, incluindo a cultura autista) vem produzindo processos de ‘coming out’ deficiente, análogos aos ‘coming outs’ de gays, lésbicas e negros, declarando um ‘orgulho surdo’ que remete ao orgulho gay, lésbico ou negro, o qual corresponde na neurodiversidade à declaração do orgulho autista, como veremos. O surgimento do ‘Orgulho surdo’ (Deaf Pride) se remonta ao ano de 1972, quando Bárbara Kannapel criou a organização do mesmo nome, dedicada a promover a consciência dos surdos. Os

4

sentimentos de submissão, depreciação e vergonha surda, comuns até essa época, deixam lugar a um movimento de afirmação identitária, auto-estima e orgulho, em uma época que via tanto a legitimação científica da língua de sinais como um ambiente social tolerante com a diversidade cultural e a afirmação de todo tipo de minorias. "Os anos 70 presenciaram a ascensão não apenas do Orgulho Surdo, mas do Poder Surdo", escreve o neurologista Oliver Sacks. "Emergiram líderes entre os outrora surdos passivos. Surgiu um novo vocabulário, com palavras como ‘autodeterminação’ e ‘paternalismo’. Os surdos, que antes haviam aceito as caracterizações de si mesmos como ‘inválidos’ e ‘dependentes’ – pois era assim que tinham sido considerados pelos ouvintes – agora passavam a julgar-se poderosos, uma comunidade autônoma" (Sacks, 2002: 164).

Quando um grupo social é estigmatizado pela maioria da sociedade, a autodeclaração da identidade constitui um processo de ‘coming out’. A afirmação ‘sou deficiente’ (surdo, cego, autista, entre outros) constitui uma afirmação de auto-categorização, um processo de subjetivação e de formação de identidade. Para os teóricos dos estudos da deficiência, essa afirmação permite um deslocamento do discurso dominante da dependência e anormalidade para a celebração da diferença e o orgulho da identidade deficiente (Swain & Cameron, 1999; Corker, 1999). Trata-se tanto de um compromisso coletivo e político de protesto contra as barreiras sociais incapacitantes encaradas pelos indivíduos com algum tipo de invalidez, como de uma transformação da identidade pessoal vivenciada com orgulho. Além dos impasses que as políticas identitárias apresentam, aos quais aludirei mais adiante, parece-me importante ressaltar uma questão recorrente associada ao enaltecimento da identidade e do orgulho deficiente. Pois, freqüentemente a afirmação identitária está ligada à recusa da cura, a qual é vista como uma forma de combater a diferença e a diversidade do corpo e do cérebro humano. O ‘movimento anticura’ constitui um desafio apresentado que ultrapassa o âmbito mais estrito dos deficientes, suas famílias, médicos e cuidadores, estendendo-se ao âmbito das políticas públicas de saúde e educação. O argumento básico é o seguinte: se a deficiência é um fenômeno criado socialmente e perpetuado culturalmente, então também a cura e os valores a ela associados são igualmente socialmente construídos: "Se você não acreditar que há deficiência, se não acreditar que há algo que necessita ser ‘curado’ ou prevenido geneticamente – então você será igualmente libertado da necessidade de cura" (Cheu, 2004: 209).

Os teóricos dos estudos da deficiência denunciam um modelo utópico de perfeição corporal e cura no qual a deficiência não existe. Na cultura somática contemporânea ou biossociabilidade, as ações individuais passam a ser dirigidas com o objetivo de obter melhor forma física, mais longevidade, prolongamento da juventude, entre outros. Todo um vocabulário médico-fisicalista baseado em constantes biológicas, taxas de colesterol, tono muscular, desempenho físico, capacidade aeróbica populariza-se e adquire uma conotação "quase moral", fornecendo os critérios de avaliação individual. Ao mesmo tempo todas as atividades sociais, lúdicas, religiosas, esportivas, sexuais são resignificadas como práticas de saúde. O que alguns autores denominaram de healthism ou santé-isation,5 e que pode ser traduzido como a ideologia ou a moralidade da saúde, exprime essa tendência. Segundo essa ideologia, a saúde tornou-se também um valor absoluto ou padrão para julgar um número crescente de condutas e fenômenos sociais (Crawford, 1980: 381). Como resultado,

5 A literatura sobre o tópico é imensa, ver, entre outros, Crawford, 1980; 1994; Conrad, 1995; Petersen, 1997; Bunton, 1997; Aïach, 1998 ; Faure, 1998 ; Druhle e Clément, 1998 ; Morris, 2000; Greco, 1993.

5

contemplamos as doenças que retorcem a figura humana como sinônimo de fracasso pessoal. "É uma religião secular", salienta David Morris (2000: 159), "da qual os deficientes e os desfigurados estão, evidentemente, rigorosamente excluídos a não ser que estejam dispostos a representar o papel ossificado designado para eles nos reality-shows como modelos corajosos de ‘ajustamento pessoal, esforço e realização’". Historicamente as deficiências estavam ligadas ao crime, ao mal, às aberrações (Foucault, 1999). Os estereótipos atuais contra os gordos, idosos e outras figuras que fogem do padrão do corpo ideal têm o mesmo efeito estigmatizador e excludente. A obsessão pelo corpo perfeito faz aumentar o preconceito e dificulta o confronto com o fracasso de não atingir esse ideal, como testemunham anorexias, bulimias, distimias e depressões. Essa fixação produz e reforça as doenças debilitantes (Ortega, 2007). Morris aponta com razão que o modelo biomédico que sustenta essa obsessão implica assumir "que há algo errado com os portadores de deficiências" (2000: 162).

Um exemplo histórico resulta extremamente revelador dessa tendência, qual seja, a negação e encobrimento da deficiência do presidente americano Franklin Delano Roosevelt que sofria de poliomielite.6 Roosevelt era apresentado publicamente como modelo de recuperação e triunfo sobre a deficiência física, situação que se assemelharia à recuperação e triunfo dos EUA sobre a época da depressão. Ele teve poliomielite, sim, mas conseguiu vencer a doença. A obsessão de Roosevelt de não ser visto como deficiente conduziu a uma enorme parafernália de estratégias que incluíam desde diversas manobras para ocultar cadeiras de rodas, muletas ou bengalas usadas para caminhar, até a destruição por parte do serviço secreto de fotos ou filmes nos quais o presidente era alçado (o presidente nunca era alçado em público). Nas imagens veiculadas pela mídia, o presidente aparecia freqüentemente com um charuto na boca, nunca numa cadeira de rodas. A obsessão com negar sua deficiência se arrasta até nossos dias, como se depreende da controvérsia em torno à edificação do seu memorial. Membros da comissão encarregada da construção e da família de Roosevelt não cederam às pressões de grupos de ativistas deficientes de que o presidente aparecesse em alguma das estatuas e imagens desenhadas com a cadeira de rodas, muletas ou bengalas que sempre usava (Davis, 1995). Roosevelt construiu sua imagem como o ‘aleijado curado’ (cured cripple), a qual ecoou até nossos dias na retórica ‘Irei andar de novo - tudo-é-possível’ de um Christopher Reeve, o ator que representava o Superhomem, outro mito emblemático da sociedade americana. Os corpos anormais e deficientes devem ser exorcizados na construção de uma imagem nacional que pressupõe um ideal de perfeição corporal. É nesse contexto que se situa a retórica anticura defendida por diversos teóricos e ativistas do movimento deficiente. Vejamos a seguir, como esses desdobramentos constituem o pano de fundo para o recente surgimento do movimento da neurodiversidade.

Transtornos do espectro autista e neurodiversidade

Apesar de podermos utilizar o termo ‘neurodiversidade’ em um sentido amplo, para referirmos aos diversos tipos de transtornos neurológicos como são descritos, por exemplo, nos livros de Oliver Sacks (que não usa o termo), ou de maneira mais estrita em relação ao autismo, transtorno bipolar, ansiedade, depressão, e ao transtorno de déficit de atenção e

6 Anos depois uma estória parecida se repetiria com o encobrimento da doença de Addison pelo presidente Kennedy, que poderia tê-lo matado caso não houvesse sido assassinado.

6

hiperatividade (TDAH), como pretende Susanne Antonetta (que o usa no seu livro, Mind Apart. Travels in a Neurodiverse World), o termo é usado geralmente para se referir aos transtornos do espetro autista, e mais especificamente aos chamados de ‘autismo de alto funcionamento’ (high functioning autism), identificado amiúde com à síndrome de Asperger.

Acredito que o surgimento do termo e do movimento de ‘neurodiversidade’ na virada do século XXI deve ser analisado a partir de um marco sócio-cultural e histórico mais amplo que incorpore por um lado, a história e os desdobramentos dos estudos da deficiência e dos movimentos de deficientes, aos quais tenho me referido acima, como por outro lado o impacto crescente no imaginário cultural dos saberes e práticas neurocientíficas com o paradigma do sujeito cerebral e a expansão da neurocultura e as neurossociabilidades, às quais me referirei mais adiante.

A história do movimento de neurodiversidade, e mais especificamente em relação à cultura autista, está ligada ao deslocamento das concepções psicanalíticas para uma concepção biológica e cerebral do transtorno autista. Dos anos de 1940 a 1960 predominaram as explicações psicanalíticas do autismo na teoria e clínica psiquiátrica. De Leo Kanner no seu artigo seminal, "Os distúrbios autísticos do contato afetivo", de 1943, até Bruno Bettelheim, Margareth Mahler e Francis Tustin, o autismo foi compreendido em termos de falhas no estabelecimento das relações objetais precoces do indivíduo, especialmente com os pais. Isso não quer dizer que ainda hoje não existam explicações psicanalíticas do transtorno autista, predominantemente do campo lacaniano. No entanto, é inegável que desde os anos 60 vem se produzindo um deslocamento para explicações orgânicas, especialmente cerebrais do transtorno, culminando em 1980 com a inclusão do autismo na rubrica de Transtornos Abrangentes do Desenvolvimento, separando-se definitivamente do grupo das psicoses infantis, na terceira edição do DSM (DSM-III).7 Desde então, e mais especificamente no mundo anglo-saxão, as compreensões neurológicas e genéticas do transtorno dominam o campo psiquiátrico. Não pretendo entrar no mérito das novas concepções e a recusa do modelo psicanalítico, embora a avalanche de dados e trabalhos empíricos produzidos desde os anos 70 vem tornando difícil acreditar que não exista algum componente orgânico no transtorno, dando assim uma relevância às explicações genéticas e cerebrais e ofuscando as concepções psicanalíticas que rechacem esse componente. Mas o que me parece mais importante para os objetivos deste texto, pois está na base do surgimento dos movimentos de neurodiversidade e da cultura autista, é que nas explicações psicanalíticas do transtorno, e mais especificamente no caso de dois dos seus principais teóricos, Leo Kanner e Bruno Bettelheim, o autismo era concebido exclusivamente em termos negativos, focalizando na culpa dos pais, os quais teriam falhado no estabelecimento de relações objetais precoces. A famosa ‘mãe geladeira’ de Kanner, ou as metáforas de "fortalezas vazias", "tomadas desligadas", "conchas", "carapaças", "ovos de pássaros" e "buracos negros" usadas pela tradição psicanalítica para se referir às crianças autistas, remetem para uma visão negativa que enfatiza as idéias de déficit, impossibilidade e deficiência (Cavalcanti, Rocha, 2001).

7 A síndrome de Asperger, no entanto, só foi incluída na quarta edição do DSM (DSM-IV) em 1994. O termo foi usado por Lorna Wing em 1981 em deferência ao trabalho de Hans Asperger, contemporâneo de Leo Kanner. Ver Wing, 1981; 1997.

7

Desde meados de 1940 até pelo menos meados de 1960 houve no mundo anglo-saxão uma verdadeira "orgia de ataques aos pais" (orgy of parent-bashing) usando a expressão de Edward Dolnick (1998: 184), que dificultou a aparição de algum tipo de organização de autistas e/ou de seus familiares. No seu livro, Dolnick destaca que os pais absorveram as acusações e suportaram pacientemente a culpa não apenas pela hegemonia médica e sócio-cultural do paradigma psicanalítico, mas – e o que é mais importante – devido ao fato de que, frente às explicações orgânicas que remetiam para uma certa inevitabilidade, uma sentença definitiva, a abordagem psicológica parecia oferecer algum tipo de esperança. "Havia uma parte de mim que queria acreditar em Bettelheim" declara Annabel Stehli, mãe de filha autista, após a leitura de A fortaleza vazia de Bruno Bettelheim, "porque isso significaria que se eu melhorasse, Georgie iria melhorar. (...) Se eu mudasse, Georgie iria melhorar e eu queria que minha filha melhorasse" (apud, Dolnick, 1998, 205-6). O preço a pagar era muito caro, como a mesma Stehli reconhece: "Aqui havia alguém assassinando minha personalidade (…) Era, provavelmente, como um judeu na Alemanha em 1936 lendo algo escrito por Hitler sobre o que são os judeus" (ibid., 179).

O deslocamento do modelo psicanalítico e a aproximação das neurociências possibilitou que os pais fossem desresponsabilizados e desimplicados dos destinos subjetivos dos filhos (Cavalcanti, Rocha, 2001). Apesar das críticas do modelo psicanalítico a essa aparente ‘desimplicação’ e da aproximação das neurociências, é precisamente devido ao deslocamento do paradigma psicanalítico que surgiram tanto os movimentos de pais e profissionais que buscam uma cura para o autismo e apóiam terapias comportamentais e psicofarmacológicas como os movimentos da neurodiversidade. Estes últimos rejeitam as explicações psicológicas negativistas e culpabilizantes, afirmando um autismo cerebral, na base de uma identidade autista vivenciada com orgulho. Voltarei mais adiante à vinculação do autismo cerebral com a afirmação identitária.

As explicações cognitivistas propostas desde os anos 80, especificamente por Alan Leslie, Uta Frith e Simon Baron-Cohen baseiam-se na idéia de "cegueira mental" (mindblindness) presente nas crianças autistas. Essas crianças careceriam de uma ‘teoria da mente’, isto é, da capacidade de atribuir estados intencionais a terceiros, de colocar-se no lugar do outro, necessária para a interação social.8 Esse modelo é criticado pelos ativistas do movimento autista por se tratar de um modelo homogêneo que não dá conta da diversidade e singularidade dos indivíduos. Assim, frente ao modelo da ‘consciência como a minha’ (like-me awareness), implícito no modelo da teoria da mente do cognitivismo, os autistas, ou ‘neuro-atípicos’ apostam em uma ‘consciência não como a minha’ (not-like me awareness) mais sofisticada: "A teoria da mente neurotípica acredita que todos pensam como eu, enquanto a teoria neuroatípica consideraria a mente de todos como ‘vasta e misteriosa’, diferente da minha própria" (Antonetta, 2005: 167).

8 Baron-Cohen, 1995; Frith, 1991. Para compreender as diferentes versões da teoria da mente no estudo do autismo, ver Zahavi, 2005. Dan Zahavi tem discutido a idéia da ausência da teoria da mente no autismo e proposto algumas distinções interessantes. O modelo proposto por Baron-Cohen e outros acerca da cegueira mental seria um modelo intelectualista. O problema dos autistas não é que careçam de uma teoria da mente, mas sim de uma compreensão imediata, pré-reflexiva ou implícita das expressões emocionais e das regras de interação social. Eles precisariam de um mecanismo compensatório fornecido por uma teoria da mente precisamente por carecer de esta compreensão. Ao meu conhecimento, o modelo de Zahavi não foi discutido pelos ativistas autistas, Acredito que fariam objeções semelhantes às feitas ao modelo intelectualista da teoria da mente.

8

Curiosamente um dos proponentes do modelo da ‘teoria da mente’, Baron-Cohen (2000), manifestou-se recentemente a favor de substituir o modelo da ‘deficiência’ pelo o da ‘diferença’ ao considerar o autismo não como uma deficiência a ser curada, mas como um ‘estilo cognitivo diferente’ (different cognitive style), comparável à sinistralidade, aproximando-se das teses da neurodiversidade.

Esse deslocamento do modelo da deficiência para o da diferença na caracterização do transtorno autista permite compreender o surgimento recente dos movimentos de neurodiversidade.

Judy Singer, criadora do termo ‘neurodiversidade’ em 1999, acredita que o aparecimento do movimento tornou-se possível por vários fenômenos, principalmente a influência do feminismo, que forneceu às mães a autoconfiança necessária para questionar o modelo psicanalítico dominante, que as culpava pelo transtorno autista dos filhos; a ascensão de grupos de apoio aos pacientes e a subseqüente diminuição da autoridade dos médicos, possibilitado, sobretudo, pelo surgimento da Internet, que facilitou tanto a organização dos grupos como a livre transmissão de informações sem mediação dos médicos; e, finalmente, como vimos no início do texto, pelo crescimento de movimentos políticos de deficientes, movimentos de autodefesa e auto-advocacia, especialmente de surdos, que estimulou a auto-representação da identidade autista (Lage, 2006).

Os movimentos pró- e anticura no autismo

A história do movimento de auto-advocacia do autismo é precedido pela publicação de relatos autobiográficos de indivíduos autistas. Temple Grandin e Donna Willians são possivelmente as mais conhecidas. Já desde meados dos anos de 1960 aparecem as primeiras associações de pais de autistas. Entre as pioneiras se encontra a British Society for Autistic Children (conhecida atualmente por The National Autistic Society). Em 1964, Bernard Rimland autor de Infantile Autism: The Syndrome and Its Implications for a Neural Theory of Behavior, funda a Autism Society of America. Logo surgiriam associações semelhantes em muitos países.9 Mas é o surgimento da Internet no início dos anos 90 do século passado que marca o principal ponto de inflexão nas organizações de auto-advocacia. Entre as pioneiras se encontra a Autism and Developmental Disabilities List (AUTISM List) criada em 1991 por Ray Kopp e o Dr. Zenhausern na Universidade de St. John no formato de lista de Internet. A lista foi em grande medida responsável pela difusão da terapia comportamental (Análise Aplicada do Comportamento - Applied Behavioral Analysis – ABA). A obsessão pela cura e pelas formas de adaptar às crianças autistas tem dado o tom na lista. Esse padrão que enfatiza exclusivamente a procura pela cura levou a uma série de críticas de adultos no espectro de transtornos autísticos, os quais se sentem incompreendidos e desconsiderados pelos especialistas e os familiares de autistas. Como conseqüência, surgiu em 1992 entre os autistas australianos e dos EUA, a Autism Network International (ANI), criada pelos autistas Jim Sinclair e Donna Williams (Sinclair, 2005). Apesar de não vetar a entrada a não-autistas, a tomada de decisões deveria estar na mão dos autistas: "Por autistas para autistas" (By autistic for autistics) tem sido um valor central da ANI desde sua origem, reproduzindo a ideologia dos estudos da deficiência: ‘nada sobre nós sem nós’ (nothing about us without us). Essa exigência da presença de autistas na

9 Ver, Dekker, 2006; Wing, 1997; Shapiro; 2006; Verbete "Autism rights movement", in Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Autism_rights_movement (acessado em 20.05.2007).

9

tomada de decisões é reivindicada freqüentemente pelos ativistas do movimento (sendo a maioria portadores da síndrome de Asperger) na crítica aos movimentos de associações de pais e especialistas dos movimentos pró-cura. Para os primeiros, é uma questão de empowerment do movimento, de autodeterminação na base da auto-advocacia. Obviamente, não se trata de que os pesquisadores e profissionais trabalhando com autismo devam se encontrar eles mesmos dentro do espectro do transtorno, mas de que na tomada de decisões, na auto-organização social e política do movimento estejam portadores do transtorno. O que não resolve o problema, visto que ativistas do movimento e organizações de pais e profissionais possuem, como veremos, concepções antagônicas do que seja o autismo, quais sejam, doença a ser tratada ou diferença a ser respeitada e cultivada. Isso não impede que as críticas do movimento deslegitimem a posição dos grupos pró-cura com o argumento de que estão decidindo por eles. Os grupos de pais e profissionais objetam que a maioria dos autistas, especialmente as crianças, não tem condição de saber qual é decisão correta, e que as vozes do movimento são de indivíduos que não deveriam ser considerados autistas. São acusados de estar no extremo mais funcional do espectro do transtorno, beirando a ‘normalidade’, uma situação muito díspar da vivida pela maioria das crianças autistas. Tratar-se-ia de uma minoria que se advoga o direito de falar no nome de uma maioria que não possui as capacidades cognitivas e emocionais requeridas para essa tomada de decisão.

O objetivo das listas criadas por autistas é contestar a visão negativa do autismo representada nas primeiras listas de profissionais e familiares de crianças autistas, cuja obsessão com a cura é considerada um desrespeito da forma de ser autista. Se o autismo não é uma doença e sim uma diferença, a procura pela cura constitui uma tentativa de apagar a diferença, a diversidade. É por isso que os movimentos de anticura vêm ganhando força dentro dos movimentos de auto-advocacia autista (Sinclair, 2005). Na contramão se encontram organizações como Cure autism now,10 fundada em 1995, por Jonathan Shestack and Portia Iversen, pais de uma criança autista, e que reúne pais, médicos e cientistas consagrados a acelerar o ritmo da pesquisa biomédica do autismo, levantando fundos para a pesquisa e a educação. Esta organização vem sendo criticada duramente por ativistas do movimento autista, que a acusam de demonizar os autistas e assustar as suas famílias, promovendo visões estreitas do transtorno e não escutando as experiências de adultos autistas. Um exemplo ilustrativo dessa crítica aparece no website Autistic.org, que mostra uma lixeira cheia de fetos autistas mortos com as iniciais de Cure autism now , diante de uma clínica de abortos com a legenda "O verdadeiro significado da ´prevenção do autismo`" (www.autistic.org ).

Frank Klein, autor do website Autistic advocacy,11 acusa às organizações tais como Cure Autism Now e Defeat Autism Now de assumir que todo o mundo concorda com a idéia de que o autismo seja uma coisa terrível que deva ser eliminada. Klein compartilha com o movimento pró-cura o desejo de que o sofrimento de autistas deixasse de existir bem como a incapacidade dos autistas de cuidar de si e viver de maneira independente. No entanto, refletindo acerca dos motivos pelos quais considera essas organizações como ‘inimigas’, faz a seguinte observação: "Bem, a resposta não é difícil de se ver. Se você olhar, está bem

10 Ver http://en.wikipedia.org/wiki/Cure_Autism_Now ; e http://www.cureautismnow.org (acessado em 1.06.2007).

11 http://home.att.net/~ascaris1/index.html (acessado em 01.12.2006).

10

ali, nos nomes de seus grupos. Se eles nos aceitassem, de verdade, como indivíduos igualmente válidos, eles não estariam tentando nos curar ou nos derrotar. Intencionalmente ou não, é assim que interpreto seus esforços e não estou sozinho nessa linha de pensamento. Ser autista é intrínseco, faz parte de quem a pessoa é e não poderia ser removido (ainda que existisse cura) sem danificar irreparavelmente a pessoa que existia anteriormente. Curar-me é destruir-me e me substituir por outra pessoa... alguém mais normal, alguém que o subgrupo mais intolerável das pessoas normais possa tolerar melhor. Curar o autismo significa erradicar do planeta pessoas como eu...eliminar completamente o meu tipo. Eu vejo isso com um genocídio. Não vejo a eliminação do meu tipo como a "solução final" para os problemas que vêm atrelados ao autismo" (ibid.).

Neurodiversidade e cultura autista

Na citação anterior, Klein toca no credo básico do movimento da neurodiversidade. O termo foi, como assinalado, cunhado pela socióloga e portadora da síndrome de Asperger Judy Singer em 1999 num texto com o sugestivo título de "Por que você não pode ser normal uma vez na sua vida?’ De um ‘problema sem nome’ para a emergência de uma nova categoria de diferença" (‘Why can´t you be normal for once in your life?’ From a ‘problem with no name’ to the emergence of a new category of difference). Como lemos no início da entrada ‘neurodiversity’ em wikipedia e nas dúzias de sites dedicados ao movimento,12 o conceito tenta salientar que a ‘conexão neurológica’ (neurological wiring) atípica (ou neurodivergente) não é, como vimos, uma doença a ser tratada e se for possível curada. Trata-se antes de uma diferença humana que deve ser respeitada como outras diferenças (sexuais, raciais, entre outras). Eles são ‘neurologicamente diferentes’, ou ‘neuroatípicos’. Indivíduos diagnosticados com autismo, especialmente portadores da síndrome de Asperger são a força motriz por trás do movimento. Para eles, como já foi mencionado, o autismo não é uma doença, mas uma parte constitutiva do que eles são. Procurar uma cura implica assumir que o autismo é uma doença, não uma ‘nova categoria de diferença humana’, usando a expressão de Singer (1999: 63). Se a neurodiversidade ou ‘neuroatipicidade’ é uma doença, então a ‘neurotipicidade’ também é. Nesse sentido, vale a pena conferir na web o irônico site do Insttituto para o estudo dos neurologicamente típicos (Institute for the Study of the Neurologically Typical) (http://isnt.autistics.org ). O autor do ‘instituto’ confessa que criou o site como expressão do "ultraje autista", depois de conferir que o que é escrito por "especialistas" e "profissionais" sobre o autismo é "arrogante, insultante e simplesmente errado". No site, a ‘síndrome neurotípica’ é caraterizada como "um transtorno neurobiológico caracterizado pela preocupação por questões sociais, delírios de superioridade e obsessão com a conformidade. Além disso, os indivíduos neurotípicos (NT) "freqüentemente assumem que sua experiência do mundo é ou a única ou a única correta. Neurotípicos acham difícil ficar sozinhos e, geralmente, são aparentemente intolerantes as menores diferenças no outros". No site apreendemos que 9625 em cada 10,000 indivíduos são neurotípicos e que não existe cura conhecida para a ‘síndrome neurotípica’.

12http://en.wikipedia.org/wiki/Neurodiversity (acessado em 01.12.2006).O mais famoso é http://www.neurodiversity.com (acessado em 01.12.2006)

11

os defensores da neurodiversidade. Para eles, o autismo não é como um câncer que deva ser curado, estando mais para as tentativas de curar a sinistralidade, ou a homossexualidade (Harmon, 2004a, 2004b, 2004c). Se, como vimos, a deficiência é uma construção social, a cura também é. Assumir o autismo como diferencia libera os indivíduos do desejo ou da necessidade da cura, o que resulta muito importante em uma época na qual existem grandes chances de dispormos em breve de testes genéticos que poderão impedir crianças autistas de nascer. Encontramos também um "Online NT Screening Test", questionário com numerosas perguntas que permitem diagnosticar a ‘síndrome neurotípica’. O objetivo desse site é, obviamente, desconstruir a retórica pró-cura de muitas organizações de pais e profissionais. Visa-se mostrar que o absurdo de tentar curar ou diagnosticar a ‘normalidade’ - que aparece aqui na versão cerebral de ‘neurotipicidade’ - é semelhante ao absurdo de tratar de curar o autismo. Por que nos chocariam as tentativas de curar a ‘neurotipicidade’ (possibilidade apresentada ironicamente no site), enquanto que aceitamos sem pensar a retórica pró-cura de associações como Cure Autism Now, Defeat Autism Now ou Autism speaks que, no fundo, defendem uma determinada ‘normalidade’ ou ‘tipicidade’ cerebral? Curar um neurotípico seria o mesmo que curar um indivíduo gay, negro, canhoto ou autista, afirmam

Em torno dos padrões autísticos de pensamento e de interesses vem aumentando o número de páginas da internet que exprimem a ‘cultura autista’. Como vemos ao clicar o termo ‘cultura autista’ e ‘neurodiversidade’ no google encontramos uma quantidade enorme de sites que afirmam a identidade autista (e mais especificamente Aspie, em referência à síndrome de Asperger) e celebram essa subcultura, os quais incluem desde indicações de literatura de ficção e especializada sobre os mais variados aspectos do espectro do transtorno até organizações de apoio, blogs e mecanismos de chat que facilitam a interação entre autistas, esclarecem elementos do transtorno, ajudam a compartilhar experiências, e até mesmo encontrar amigos ou futuros companheiros e cônjuges. Para a famosa autista Temple Grandin, o casamento entre autistas é natural, visto que, "os casamentos funcionam melhor quando duas pessoas com autismo se casam ou quando a pessoa se casa com um deficiente ou com um parceiro excêntrico...Eles se atraem porque seus intelectos trabalham em um comprimento de onde similar" (apud Silberman, 2001). O objetivo fundamental dos movimentos é promover a conscientização e o empowerment da cultura autista, que inclui a comemoração do ‘Dia do Orgulho Autista’ (Autistic pride day), que, inspirado pelo dia do orgulho gay, é festejado no dia 18 de junho como celebração da neurodiversidade dos autistas.13 Desde 2005 o ‘Dia do Orgulho Autista’ teve os seguintes temas: ‘Aceitação, não cura’ (2005); "Celebrando a neurodiversidade" (2006); "Autismo fala. É hora de escutar" (2007). No Brasil, o recentemente criado Movimento Orgulho Autista Brasil, integra uma rede de países que comemora a neurodiversidade nessa data.14 Como Prova disso é o fato que o principal evento mundial do ‘Dia do Orgulho Autista’ de 2005 foi realizado em

13 Ver a entrada "Autistic Pride Day" em Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Autistic_Pride_Day (acessado em 16.06.2007).

14 Ver Lage 2006a, 2006b; Caversan, 2005; http://www.parallax.com.br/anjosdebarro/orgulho/ (acessado em 10/06/2007).

12

Brasília. Na contramão, se encontram também no Brasil as associações de pais e profissionais que buscam cura para autismo.15

A proliferação nos últimos anos dos movimentos da neurodiversidade e ao aumento de sua exposição à mídia, tem intensificado o embate político entre os ativistas do movimento autista e as organizações de pais e profissionais dos grupos pró-cura.16 Recentemente os debates têm subido de temperatura vertiginosamente. Em 2004, a publicação por Amy Harmon de uma série de artigos no New York Times sobre a neurodiversidade deu grande visibilidade ao movimento (Harmon, 2004a, 2004b, 2004c). Neles, é apresentada a posição dos ativistas autistas que consideram o autismo como parte essencial do que eles são e se opõem à cura. Apesar de fazer referência também às críticas de pais e especialistas ao movimento, os artigos provocaram uma série de críticas dos movimentos pró-cura e de pais de crianças autistas. Numa emotiva carta aberta ao New York Times, Kate Weintraub, mãe de uma criança autista, critica a parcialidade da visão apresentada favorável à neurodiversidade. Sua posição pode ser resumida na frase "Autismo é um transtorno, não é um estilo de vida ou apenas um jeito diferente de ser".17 Ela também se refere às acusações de alguns ativistas autistas que culpabilizariam os pais pela situação dos filhos, os quais, para os mais radicais, deveriam ser afastados dos genitores. Os pais são "ridicularizados como ‘obcecado pela cura’ (curebies)18 e retratados como escravos da conformidade, tão ansiosos para que seus filhos pareçam normais que eles não conseguem respeitar sua forma de comunicação" (Harmon 2004c). Essas observações provocam a ira de Weintraub e outros ativistas dos movimentos pró-cura, para quem os ativistas "não deveriam falar como se meus filhos fossem como eles e necessitassem ser salvos de seus pais".19 Embora os movimentos autistas possuam uma retórica claramente antipsicanalista, ecoam em algumas afirmações o tom culpabilizante que caracteriza a visão psicanalítica. Se a psicanálise acusava os pais de crianças autistas de ser frios, obsessivos e mecânicos no tipo de atenção dada aos filhos,20 o movimento de autistas os acusa de ser intolerantes com seu modo de ser (neuro)diferente, de não amá-los do jeito que eles ‘são’ e de querer falar em nome deles. Assim, os pais não estariam aflitos

15 As mais conhecidas são AMA (Associação de Amigos de Autistas: www.ama.org.br ), AUMA (Associação de Amigos da Criança Autista: www.autista.org.br ). Resulta sintomático que, em um especial dedicado ao autismo, a revista EPOCA apresente apenas a visão pró-cura e pró-terapia cognitiva do transtorno. Ver Nogueira, 2007.

16 Para entender o debate e as posições em jogo, ver o excelente verbete "Autism rights movement" em wikipedia, op.cit.

17 http://www.sarnet.org/ltr/weintraub1-05.htm (acessado em 1.12.2006). Ver também Weintraub (2005).

18 ‘curebie’ é um termo criado pela comunidade autista para descrever e criticar àqueles que pretendem desesperadamente curar o autismo. È um termo de difícil tradução que poderia ser vertido como ‘obcecado pela cura’. Ver, http://www.urbandictionary.com/define.php?term=curebie (acessado em 30.09.2007).

19 http://www.sarnet.org/ltr/weintraub1-05.htm (acessado em 1.12.2006).

20 Essa posição foi consensual na psicanálise americana entre os anos de 1940 e 1960, identificada fundamentalmente com as figuras de Leo Kanner e Bruno Bettelheim. Sirva como exemplo a seguinte frase lapidar de Bettelheim no seu famoso A fortaleza vazia (The Empty Fortress): "Eu mantenho minha crença de que o fator precipitante no autismo infantil é o desejo dos pais de que seu filho não deveria existir" (Bettelheim, 1967: 125). Ver tambem, Pollack, 1997.

13

pelo autismo do filho, mas pela perda do filho que esperavam e esperam poder ter (Sinclair, 1993). A ‘parentectomy’ proposta por Bettelheim ecoa nas acusações do movimento autista.

O lançamento recente do filme Autism Every Day,21 produzido por Lauren Thierry e Jim Watkins e patrocinado pelo grupo pró-cura Autism speaks (www.autismspeaks.org) vem acirrando os debates. O filme que mostra o cotidiano de várias crianças autistas é criticado por ativistas autistas por mostrar apenas crianças golpeando as cabeças contra a parede, se jogando no chão e se lançando no trânsito. Segundo eles, trata-se de uma visão parcial do mundo autista que exclui autistas com habilidades especiais como tocar o violino ou fazer proezas esportivas. O filme também mostra uma mãe que admite ter pensamentos assassinos e/ou suicidas na sua convivência com o inferno autístico. Alguns autistas vêm coletando assinaturas em uma petição, cujos objetivos são os seguintes: " Repudiar totalmente a noção de assassinato como uma reação aceitável ao distúrbio. Negar veementemente que a maioria dos pais de crianças autistas ou deficientes possua pensamentos assassinos. Atestar que a falsa ‘realidade’ inventada pelos discursos autistas no filme ‘Autismo todos os dias’ não reflete verdadeiramente a realidade da paternidade/maternidade de filhos autistas. Requerer um pedido público de desculpa por parte de Lauren Thierry por aumentar a ignorância acerca do autismo".22 A petição intitulada ‘Autismo fala: Não fale por me’ (Autism Speaks: Don´t Speak For Me) se serve de um trocadilho que critica precisamente a associação ‘Autismo fala’ (Autism Speaks) por falar no nome dos autistas (Don´t Speak For Me), reforçando o argumento assinalado de que está sendo decidido por eles. A petição conta atualmente com quase 900 assinaturas.

Um dos pontos mais conflitantes diz respeito à terapia cognitiva ABA (Análise comportamental aplicado - Applied Behavior Analysis), que para muitos pais constitui a única terapia que permite que as crianças autistas realizem algum progresso no estabelecimento de contato visual e em certas tarefas cognitivas. Para os ativistas autistas, a terapia reprime a forma de expressão natural dos autistas.23 A questão é acirradamente debatida no mundo anglo-saxão, já que muitos pais estão lutando na justiça para conseguir que governos e companhias de seguros de saúde paguem pela terapia, cujo custo é muito elevado. Desse modo, os argumentos defendidos pelos movimentos da neurodiversidade de que o autismo não é uma doença e as tentativas de cura uma afronta contra os autistas podem fornecer razões para recusar o financiamento das terapias. Esse fato provoca a irritação de pais e profissionais que lutam pela implantação e custeio público das terapias. "Ao publicar repetidamente artigos que influenciam os leitores a ver o autismo como apenas uma forma diferente de ser", acusa Kate Weintraub na mencionada carta aberta dirigida ao New York Times, "você está ajudando a influenciar uma geração de pais, professores e outros líderes da comunidade autista a negar o tratamento a crianças autistas. Isto é algo muito sério, com conseqüências muito graves. Se seu filho tem autismo severo e sua escola anuncia que a ABA não estaria mais disponível, pois se passou a considerar anti-ético ensinar crianças a parecer mais com seus pares e, ao invés disso, seriam utilizadas

21 No seguinte site é possível assistir a uma versão de 13 minutos do filme Autism every Day: http://www.autismspeaks.org/sponsoredevents/autism_every_day.php

22 Ver http://www.kevinleitch.co.uk/wp/?p=398

23 Para uma crítica da terapia ABA desde o ponto de vista do ativismo autista, ver Dawson, 2004.

14

apenas a aceitação e a acomodação, neste caso, você não ficaria muito feliz, não mais feliz do que ficaria se tivesse um filho surdo e os implantes cocleares não estivessem mais à disposição, porque a surdez não seria mais considerada um transtorno". 24 O assunto chegou aos tribunais. Varias famílias canadenses entraram em 2004 em uma ação judicial argumentando que o governo deveria pagar pela terapia ABA para seus filhos por ser ‘medicamente necessária’. Trata-se do caso Auton vs. British Columbia. Michelle Dawson, ativista autista canadense,25 questionou a ética da terapia ao ser chamada como testemunha. Esse depoimento foi citado pela suprema corte canadense na sua decisão contra as famílias de filhos autistas.26 Situações como essas vêm elevando enormemente a temperatura do debate: De um lado, as famílias de autistas e suas lutas por acesso aos tratamentos e terapias comportamentais - que implicam reconhecer o autismo como uma doença (principalmente com causas genéticas e/ou cerebrais) – e para quem os movimentos de autistas com sua retórica anticura e pró neurodiversidade representam um ultraje a suas reivindicações. De outro lado, os ativistas autistas que consideram as terapias pró-cura um passo adiante na negação e intolerância da diferença e da (neuro)diversidade e na implantação de políticas eugênicas e genocidas. Vejamos estes aspectos mais pormenorizadamente.

Fronteiras disputadas: doença ou diferença?

O historiador Charles Rosenberg observa que, "entidades patológicas se tornaram atores sociais indiscutíveis, reais na medida em que temos acreditado neles e agido individualmente e coletivamente a partir dessas crenças" (2002: 240). Ele chama a atenção acerca do "poder e capacidade de penetração das entidades patológicas" e suas aparentes "estruturas neutras" (value-free frameworks) (ibid, 246). Estamos nos acostumando nas últimas décadas a negociar em público o estatuto nosológico de numerosas doenças psiquiátricas, a maioria das quais possuem uma natureza problemática. Talvez o caso mais gritante dos debates acerca da legitimidade epistemológica de uma categoria de doença psiquiátrica aconteceu no início dos anos 70 do século passado, quando a Associação de Psiquiatria Americana decidiu votar a inclusão ou não da categoria de homossexualidade por ocasião de uma revisão do DSM. Trata-se de uma doença, ou de uma escolha? E se é uma doença legitimada (com uma subseqüente base biológica), como pode ser decidido por voto o seu estatuto ontológico? (Rosenberg 2002, 2006). Os conflitos acerca do estatuto ontológico e a conseqüente legitimidade social de doenças e transtornos mentais e as

24 http://www.sarnet.org/ltr/weintraub1-05.htm (acessado em 1.12.2006).

25Uma lista de artigos de Michelle Dawson se encontra em http://neurodiversity.com/dawson.html (acessado em 1.04.2007).

26Sobre o caso Auton vs. British Columbia ver a série de matérias e artigos em: http://neurodiversity.com/auton.html (acessado em 1.04.2007).

. Um bom resumo do caso oferece a seguinte entrada de Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Auton_%28Guardian_ad_litem_of%29_v._British_Columbia_%28Attorney_General%29 (acessado em: 10.06.2007) . Ver também Baker, 2004, 2006; Harmon, 2004c; Feinberg & Vacca, 2000; Newschaffer & Curran, 2003.

15

decisões acerca da etiologia, diagnóstico e terapêutica têm sido endêmicos na história da psiquiatria dos últimos 150 anos (Rosenberg 2006). Embora não exista consenso acerca de numerosas doenças psiquiátricas, o fato de serem nomeadas como doenças constitui uma forma de poder e utilidade social. O diagnóstico e a eventual inclusão nos DSMs evidencia que "a presumida existência de entidades patológicas ontologicamente reais e definidamente específicas constituiu o princípio-chave que organiza quais decisões clínicas particulares poderiam ser tomadas racionalmente" (Rosenberg 2002: 239). Desta maneira, podemos compreender o anseio de que comportamentos tão (a primeira vista bizarros) como a apotemnophilia, isto é, o desejo de ter partes do corpo amputadas, seja reconhecido como um transtorno psiquiátrico, a ‘transtorno de identidade de amputado’ (amputee identity disorder), cunhado em analogia à categoria de ‘transtorno de identidade de gênero’ (gender-identity disorder) aplicada aos transexuais.27 Mas o que poderia resultar surpreendente é que a proposta de inclusão do "amputee identity disorder" na próxima edição do DSM não é oriunda de psiquiatras ligados aos interesses da industria farmacêutica ávida diante de uma possível ampliação do mercado de psicofármacos. São os próprios indivíduos que desejam a amputação que reivindicam a inclusão no DSM. Para eles, representa uma possibilidade de que os cirurgiões cooperem com eles e realizem as amputações.28 No caso particular da apotemnophilia, no qual muitos cirurgiões se recusam a efetuar as cirurgias, ser reconhecido como ‘doente’ pode apresentar vantagens que permitam aos indivíduos ter acesso aos procedimentos cirúrgicos, realizados em serviços públicos de saúde. Escolhi um exemplo que pode nos parecer bizarro para mostrar que, mesmo nesse caso (ou, talvez, precisamente nesses casos), as entidades nosológicas (especificamente transtornos psiquiátricos) estão sujeitas a negociação, e que, freqüentemente, os doentes e suas famílias abraçam os diagnósticos como uma base para estabelecer grupos de apoio e auto-ajuda e forçar políticas públicas favoráveis à pesquisa e tratamento das doenças. Ou seja, as coisas são muito mais complexas e nuançadas do que aparece em algumas simplificações grosseiras e demonizantes da psiquiatria biológica.

No caso do autismo a situação é um pouco diferente embora se trate de uma categoria psiquiátrica negociada publicamente. Mesmo reconhecida como entidade nosológica em 1980 pelo DSM-III (e a síndrome de Asperger em 1994 pelo DSM-IV), os transtornos do espetro autista vem se tornando ‘categorias problemáticas’, usando a expressão de Rosenberg (que a usa para falar de ‘gender identity disorder’, ‘attention déficit and hiperactivty disorder’, ‘social anxiety disorder’ e ‘premestrual síndrome’, entre outras). É o

27 Em torno à categoria de apotemnophilia vem se constituindo toda uma biossociabilidade. Em listas da internet como www.apotemnophilia.com (acessado em 1.03.2007) e www.amputee-by-choice.com (acessado em 1.03.2007) encontramos indivíduos que intercambiam fotografias com membros amputados, especulações sobre o mercado negro de amputações na Rússia, bem como debates acerca da melhor forma de se libertar dos membros indesejados, desde acidentes de trabalho, até feridas de bala e gangrena autoproduzida. (Elliott, 2003). Também podem se encontrar nesses fóruns amigos e parceiros sexuais. A oferta é bem diversa, desde amputados que desejam se relacionar sexualmente com amputados, até não amputados (e que não possuem desejo de sê-lo) que sentem desejo sexual por amputados.

28 "Fazer com os cirurgiões cooperem com eles - ter o desejo de amputação reconhecido como um transtorno mental codificado no próximo DSM-V, relatado em respeitadas revistas médicas e legitimado com instrumentos diagnósticos, leis de reembolso e como uma especialidade clínica" (Elliott, 2003: 220).

16

estatuto ontológico do autismo que está sendo disputado: doença para uns, exemplo da diversidade do cérebro humano, para outros.

O deslocamento do paradigma psicanalítico do autismo permitiu, como já foi assinalado, que pais e profissionais constituíssem associações e grupos pró-cura. Para eles, o transtorno autista é uma doença com uma etiologia orgânica (principalmente cerebral e/ou genética). A superação do modelo psicanalítico e a aproximação das neurociências desresponsabilizou e desimplicou os pais dos destinos subjetivos dos filhos e abriu o caminhou a sua organização em associações que buscam a cura do transtorno e a implantação de terapias cognitivas e comportamentais. O estatuto orgânico do autismo legitimou o movimento. Na frase feliz de Rosenberg, "legitimidade social pressupõe identidade somática" (2006: 414). Porem, o transtorno continua sendo uma categoria problemática, pois não existe consenso nem em relação à etiologia do transtorno, nem acerca da intervenção clínica mais adequada (Feinberg & Vacca, 2000).

Do ponto de vista dos ativistas autistas, as terapias constituem atentados contra a diferença e a diversidade do cérebro humano. Além disso, a possibilidade de em breve dispormos de um teste genético para detectar o risco de autismo em um feto ou embrião, pode abrir a porta para que pais tenham a opção de impedir o nascimento de um filho, mesmo com as formas mais brandas do transtorno (como é a síndrome de Asperger). Nesse sentido, Arthur Caplan, diretor do Center for Bioethics da universidade de Pennsylvania, publicou em 2005 um artigo com o provocativo título de "Você teria permitido que Bill Gates nascesse?" (Would you have allowed Bill Gates to be born?), no qual sublinha o fato freqüentemente observado que Gates apresenta muitos traços de personalidade da síndrome de Asperger, pretendendo chamar a atenção com isso para os riscos envolvidos nos testes genéticos. Obviamente o espectro do transtorno autista é muito amplo, abarcando desde os casos mais ‘de alto funcionamento’ como (presumivelmente) Bill Gates, o filósofo Ludwig Wittgenstein e o pianista Glenn Gould, até os ‘de baixo funcionamento’, crianças e adultos com retardo mental e severos comprometimentos cognitivos e funcionais. Ao meu ver, isso nos coloca diante de importantes dilemas éticos e sócio-políticos. A questão é dupla: permitirá o teste genético estabelecer as sutilezas necessárias para definir claramente em que ponto do espectro autista o feto e/ou embrião se encontra? Mas ao mesmo tempo, se se trata de um espectro, ou seja, um contínuo, qual deve ser o ponto de corte que nos justifique a dizer que até um certo ponto é aceitável o grau de comprometimento cognitivo, mas para além desse ponto se justificaria o aborto? Em poucas palavras, permitirá o teste genético diferenciar os autistas de ‘baixo’ e ‘alto’ funcionamento? Isso sem mencionar, como acredito, que, mesmo nos casos mais severos de autismo, não exista consenso ao respeito do aborto dessas crianças, como não existe mesmo em relação à síndrome de Down e outras doenças e transtornos. Para os ativistas do movimento autista, trata-se de um risco de genocídio que deve ser combatido. Abortar um feto autista seria como abortar um feto homossexual ou canhoto (caso fosse possível detectar essas características geneticamente). Os testes pré-natais constituem uma verdadeira ameaça eugênica que visa o aborto dos neurodivergentes. Dada a tecnologia, pergunta, Susanne Antonetta, autora de A mind apart. Travels in a Neurodiverse World, e diagnosticada com transtorno bipolar, "Escolheríamos apenas crianças perfeitas? Perfeitas para os olhos de quem? Nossa cultura?" (Antonetta, 2005: 92). A gravidade da situação levou a que, em 2004, ativistas do movimento entrassem com uma petição nas Nações Unidas exigindo que, diante das ameaças, fossem reconhecidos como ‘grupo social minoritário’, que merece proteção perante a

17

‘discriminação’ e o ‘tratamento inumano’. Eles se consideram uma minoria, uma cultura diferente com padrões de comunicação e hábitos diferentes (Nelson, 2004).

Diante dessa situação, cabe perguntar quais seriam as políticas públicas possíveis para dar conta da neurodiversidade. As políticas propostas pelos grupos pró-cura já foram salientadas: acesso e financiamento de terapias comportamentais (especificamente ABA), contingenciamento de recursos para pesquisa genética e neuroquímica do transtorno, entre outras. No caso da neurodiversidade, a situação é um pouco diferente, entrando em muitos casos em conflito com os interesses dos grupos pró-cura. Sirva como exemplo o interessante artigo de Baker (2006), que propõe distinguir entre ‘deficiências neurológicas’ e ‘neurodiversidade’. Essa discriminação permitiria desenhar políticas públicas que possibilitassem o acesso ao tratamento àqueles indivíduos que desejassem ser tratados e que garantissem aos que recusassem o tratamento o direito de fazê-lo, pois, "o autismo é para alguns um elemento fundamental da identidade, no qual não se quer que o estado interfira sem necessidade" (Baker, 2006: 27). O desafio seria distinguir entre os dois elementos, apoiando simultaneamente ambos, ou seja, estabelecer uma fronteira definida entre um e outro que fosse aceita tanto pelo movimento pró-cura e anticura. "Gerir simultaneamente ambos os aspectos da diversidade depende de esforços recompensadores e sustentadores que sustentem uma base de participação mais ampla, ao invés de uma proteção categórica a indivíduos selecionados". (Ibid., 27). Categorias psiquiátricas possuem sempre ‘fronteiras disputadas’ - usando a feliz expressão de Rosenberg-, um estatuto ambíguo que exige a sua constante negociação pública. No campo específico da educação e da educação especial, os modelos tradicionais orientados para o modelo da deficiência tentam curar, consertar, reparar, remediar, melhorar as ‘deficiências’ das crianças. Nesses modelos, os autistas são aproximados o máximo possível de uma norma ou são ajudados a enfrentar as deficiências da melhor maneira possível. Um modelo educativo baseado na neurodiversidade, em contrapartida, "terá um profundo respeito pela diferença (e não deficiência) de cada criança", escreve Armstrong (2005), "encontrando o melhor nicho ecológico para cada criança, no qual suas qualidades são maximizadas e seus defeitos são minimizados". O modelo da neurodiversidade necessariamente forçará uma mudança no sistema educativo "pela clara diversidade e força da organização neurológica de suas populações de estudantes" (ibid., ênfase minha). A referência ao cérebro como critério organizador é fundamental, como veremos mais adiante.

Vale a pena ressaltar um elemento comum aos movimentos pró-cura e anticura. Apesar de se encontrarem num feroz embate, ambos os movimentos compartilham a recusa às explicações psicanalíticas culpabilizantes. O deslocamento do paradigma psicanalítico para o cerebral possibilitou a organização dos dois grupos antagônicos. Para os pais de autistas, recusar a culpa pela doença dos filhos e a denúncia dos excessos da psicanálise está na base das primeiras associações que visam, como foi ressaltado, buscar formas de cura orientadas basicamente para a terapia comportamental e os tratamentos farmacológicos. Todavia, os pais de autistas convergem com as explicações psicanalíticas em tratar o autismo como uma doença, e/ ou uma deficiência, embora se inclinem para explicações genéticas e/ou cerebrais do transtorno, que exigem tratamentos farmacológicos e comportamentais e não psicodinâmicos. Os movimentos de autistas surgem, por sua vez, como recusa da visão negativa do autismo difundida pelas explicações psicanalíticas de Kanner, Bettelheim, e outros, que focaliza na incapacidade e na deficiência. Eles, no entanto, convergem (nas suas posições mais radicais) com as explicações psicanalíticas em

18

A despeito das posições antagônicas de ambos os grupos em relação a considerar o autismo como doença a ser tratada ou diferença a ser tolerada e celebrada, a superação das explicações psicologizantes (psicanalíticas) constitui uma forma de empowerment tanto para os grupos pró-cura como anticura. A cerebralização do autismo é abraçada por ambos, embora leve a posições políticas antagônicas. Aplica-se a ambos a já citada observação de Rosenberg: "legitimidade social pressupõe identidade somática" (2006: 414). Para os movimentos de pais de autistas, a cerebralização os desculpabiliza pelo transtorno, apontando para uma causalidade concreta e objetiva que possa ser usada para reivindicar verbas públicas para a pesquisa e o tratamento de crianças autistas. Os movimentos de autistas, por sua vez, se servem das explicações cerebrais para destacar a diversidade e a singularidade das conexões cerebrais, muitas das quais são neuroatípicas ou neurodivergentes. Refletem a diversidade do cérebro humano que não pode ser tratada na polaridade normal/patológico ou doença/cura. Tolerância e direito à diferença e à diversidade tomam o cérebro como referência. Como observa Muskie, autor do mencionado site do Institute for the Study of the Neurologically Typical e diagnosticado com a síndrome de Asperger: "Minha bête noire atual consiste em ter consideradas minhas emoções como ‘rasas’. Como alguém com um conhecimento consideravelmente maior sobre minhas emoções do que os ‘especialistas’ (experts), posso declarar inequivocamente que minhas emoções não são ‘rasas’. Pode ser que amanhã eu seja descrito como ‘pouco empático’ ou serei ultrajado com um excepcionalmente ignorante método ‘de treinamento’ sendo infligido sobre crianças autistas, ou talvez haja algum novo artigo escrito por algum especialista a partir da perspectiva que a percepção neurotípica está correta e que meu cérebro é um erro genético (...) Meu cérebro é uma jóia. Eu estou espantado com a mente que tenho. Eu e minha experiência de vida não são inferiores e podem ser superiores à experiência de vida dos neurotípicos" (minha ênfase)que as crianças autistas deveriam ser afastadas dos pais.29 30.

Questões identitárias: ser ou ter autismo

As associações de pais de crianças autistas se negam a reconhecer no autismo uma questão de identidade. O autismo é uma doença, não um estilo de existência ou uma marca identitária. As crianças não são autistas, elas têm autismo, como escreve Keit Weintraub (2005): "O fato de que meus filhos têm uma anormalidade no desenvolvimento não significa que eu não os ame por quem eles são, como ela [Amy Harmon] insinua tão incessantemente. Eu amo meus filhos, mas eu não amo o autismo. Meus filhos não fazem parte de um grupo seleto de seres superiores denominados ‘autistas’. Eles têm autismo, uma invalidez neurológica devastadora nas suas implicações nas suas vidas, se não for tratado (...) Em outras palavras, não é mais normal ser autista do que é ter espinha bífida." Para os

29 "Os pais são retratados como controladores enlouquecidos, egoístas e perfeccionistas (espectros das ‘mães geladeiras!’) e, os profissionais que devotaram suas vidas para ajudar nossos filhos são descritos como frios manipuladores e abusadores infantins", escreve Kit Weintraub (2005) em relação aos movimentos de autistas.

30 http://isnt.autistics.org

19

ativistas autistas, em contrapartida, o transtorno remete a uma questão identitária. Autismo não é alguma coisa (uma doença) que se ‘tem’, mas algo que se ‘é’. Não é a ‘concha’ que aprisiona a criança normal. Não podemos separar o transtorno do indivíduo, e se fosse possível teríamos um indivíduo com uma identidade diferente. O autismo é "impregnante, colore cada experiência, cada sensação, percepção, pensamento, emoção e encontro, todos os aspectos da existência" (Sinclair, 1993). Evidentemente, a posição no debate identitário determina a posição em relação à busca pela cura e às terapias. À medida que os pais de autistas falam de "ter" autismo e acolhem tentativas de cura e terapia, os movimentos da neurodiversidade apostam no "ser" autista e se opõem as tentativas de cura e terapias cognitivas.

Como já foi assinalado, a identidade autista é vivenciada pela comunidade autista com orgulho (e comemorada no 18 de Junho, o ‘Autistic pride day’). Alguns neurodivergentes usam o termo ‘gift’ (dom) para se referir a condições como autismo ou transtorno bipolar (Antonetta, 2005). Mesmo os autistas de ‘alto funcionamento’ que não vivenciam o transtorno como um ‘dom’, relatam freqüentemente uma sensação de ‘conforto’ quando obtiveram o diagnóstico. "Finalmente uma explicação, finalmente, uma razão para o porquê e o como" escreve John Carley, ao ser diagnosticado com a síndrome de Asperger (Shapiro, 2005). O filósofo Ian Hacking (2006) fala de um certo tipo de paz resultante do diagnóstico de autismo; e Judy Singer, que cunhou o termo ‘neurodiversidade’ remete aos ‘benefícios de uma identidade clara’ (Singer, 1999: 62) de ‘ser’ autista. A afirmação identitária é freqüentemente associada ao afastamento das explicações psicológicas e das psicoterapias. Em listas de autistas encontramos relatos recorrentes sobre o tempo (e o dinheiro) perdido em sessões psicanalíticas ou psicoterápicas. O distanciamento do paradigma psicológico e a aceitação das explicações neurológicas constituem uma forma de autoafirmação.31 Frente à ‘auto-consciência psicológica’ (psychological self-awareness), os autistas apostam na ‘auto-consciência neurológica’ (neurological self-awareness) (Singer, 1999) e recusam o poder da psicologia. Não é um problema de trauma ou conflito, mas de uma ‘conexão’ (wiring) cerebral diferente. Eles reclamam o direito de autodiagnóstico, e a preferência pela neurologia representa um empowerment para a cultura autista que pode tomar as decisões por si. Graças à Internet, os autistas trocam todo tipo de informações sobre o diagnóstico e demais aspectos do transtorno sem depender para isso do establishment médico.

Resulta em certa maneira paradoxal que precisamente a cerebralização do autismo esteja na base da afirmação identitária dos autistas (‘ser’ e não ‘ter’ autismo). Alem do fato de que o deslocamento do modelo psicanalítico e a aproximação das neurociências possibilitou que os pais fossem desresponsabilizados e desimplicados dos destinos

31 Sirva como exemplo o depoimento relatado no artigo de Harvey Blume (1997) acerca de uma mulher com autismo: "Depois de passar ‘... sua adolescência em um estado clínico suicida-depressivo devido ao abuso sofrido e ao sentimento de ser uma fracassada ou insana por ser diferente’, ela encontrou sua opinião ‘ apenas reforçada pelo psicoterapeuta, ao qual fui encaminhada, que decidiu que todos os meus problemas tinham que ser o resultado de uma ‘repressão sexual’’. Ela se declara orgulhosa de si mesma por ter ‘ido embora após 6 sessões’ e concluí que ter sido diagnosticada como autista ‘foi a melhor coisa que já me aconteceu’".

20

subjetivos dos filhos, a biologização (e/ou neurologização) da doença mental (seja autismo, esquizofrenia, depressão, transtorno bipolar, entre outros) leva a um distanciamento subjetivo da doença que é tratada mais ou menos como qualquer doença física. O indivíduo é desresponsabilizado na medida em que sofre um processo de distanciamento subjetivo da doença a qual é desestigmatizada, por ser uma condição do cerebral. Pois, para as explicações psicodinâmicas, "a doença mental está na sua mente e nas suas reações emocionais a outras pessoas, é o seu ‘você’". (Luhrmann, 2000: 6). Quando um psiquiatra de orientação biológica fala da depressão de maneira semelhante a como um cardiologista fala de uma doença cardíaca se produz um distanciamento subjetivo da doença, uma dessubjetivação. O indivíduo tem esquizofrenia, ou transtorno bipolar, em vez de ser deprimido, esquizofrênico e ou psicótico. Assim como o indivíduo pensa que é um indivíduo que tem uma doença cardíaca e não que é essa doença, no caso de doenças mentais a depressão ou psicose aparecem escritas no corpo – e mais especificamente no cérebro - nas descrições da psiquiatria biológica. As críticas feitas à psiquiatria biológica não devem impedir de reconhecer que ela trouxe a desculpabilização de pacientes e familiares pelas suas psicoses, transtornos alimentares, anorexia, autismo e esquizofrenia. Sirva como exemplo as famílias de filhos esquizofrênicos que suportam financeiramente as pesquisas de esquizofrenia que usam neuroimagem, isto é, uma abordagem cerebral da doença (Dumit, 2004). Para o paciente e seus familiares é mais fácil aceitar, por exemplo, o diagnóstico de transtorno bipolar que o de psicose maníaco depressiva. Pois, no transtorno bipolar se enfatizam os aspectos biológicos e cerebrais mais do que os psicológicos e psicodinâmicos que impunham uma marca identitária. O indivíduo não é mais psicótico maníaco-depressivo, mas tem transtorno bipolar. A doença mental como critério identitário se aplica antes a modelos psicológicos (ou psicanalíticos) e mentalistas do que a modelos fisicalistas/cerebralistas oriundos da psiquiatria biológica ou das neurociências. Não é o mesmo afirmar ‘há algo errado comigo’ do que ‘há algo errado com meu cérebro’. Ao passo que a doença mental diz respeito à identidade, o transtorno cerebral diz respeito ao corpo (cérebro). Se for um problema do cérebro, então o indivíduo não é culpado e, sobretudo, ele não é essa doença, ela não define a sua identidade. Frente à psicologização da doença mental, a cerebralização pressupõe uma dessubjetivação. Ora, no caso dos movimentos da neurodiversidade acontece exatamente o contrário, a cerebralização constitui uma marca identitária, uma identidade naturalizada, o indivíduo é autista (e não tem autismo) não pelo autismo ser uma doença mental, mas, precisamente, por que é uma ‘conexão atípica’ (atypical wiring) do cérebro. Para esses grupos, autismo, transtorno bipolar, transtorno de déficit de atenção, entre outros, constituem marcas identitárias, não por ser doenças mentais, mas por ser transtornos cerebrais, isto é, identidades biológicas, bioidentidades, ou, mais precisamente, neuroidentidades, que constituem a base da formação de neurossociabilidades e neurocomunidades. Os movimentos da neurodiversidade, especificamente a cultura autista, constituem exemplos de formas de subjetivação cerebrais, de formação de neuroidentidades e formas de sociabilidade e comunidade, as neurossociabilidades, tomando o cérebro como referência, como veremos.

Nesse contexto de cerebralização da identidade autista não devemos esquecer que ainda não existe consenso acerca da etiologia do autismo. Ainda que psiquiatras biológicos e neurocientistas venham procurando os últimos anos o ‘endereço cerebral’ (brain address) do transtorno (Wickelgren, 2005: 1856) e considerem o autismo um transtorno biológico, e

21

mais especificamente cerebral (Fombone 2003; Freeman & Cronin 2002; Wing 1997) – levando alguns a considerá-lo um caso extremo do cérebro masculino normal (Baron-Cohen 2002), não existe consenso nem sobre a etiologia,32 nem sobre a metodologia de intervenção clínica (Feinberg & Vacca, 2000: 131; Newschaffer & Curran, 2003). Para os autistas, por sua vez, não existe dúvida, eles afirmam categoricamente a cerebralização do transtorno. Para Temple Grandin, talvez a autista mais famosa, "o autismo é um transtorno neurológico. Uma criança nasce com isso. Isto é causado por um desenvolvimento imaturo do cérebro-- isso já foi verificado em estudos de autópsias cerebrais – e não por má criação ou pelo ambiente." (apud Blume, 1997). Ela também fez elogios entusiásticos na contracapa do livro de Edward Dolnick, Madness on the couch. Blaming the victim in the Heyday of Psychoanalysis, que constitui uma crítica feroz às explicações psicanalíticas do transtorno. A posição da comunidade autista é clara: "autismo não é nem uma deficiência física (corporal), nem uma doença mental: é uma deficiência neurológica". (Dekker, 2006). A cerebralidade do transtorno é assumida como um fato pela comunidade autista, nunca é colocada em questão, aparecendo já no termo neuro-diversidade. Nesse aspecto eles coincidem com as associações de pais de autistas, os quais também privilegiam a etiologia cerebral e genética do transtorno. A divergência está mais do lado de considerar o autismo um transtorno cerebral ou uma diferença na ‘wiring’ cerebral. Todavia, acredito que essa preferência pelas explicações cerebrais não se reduza à aversão à psicanálise e à cultura psicológica presente em ambos os grupos. Deve ser compreendida antes no contexto da neurocultura e do paradigma do sujeito cerebral e o privilegio de formas de subjetivação cerebrais, como veremos a seguir. Harvey Blume faz uma constatação semelhante ao afirmar que o "autismo não é praticamente a única – nem de longe a principal- razão para a atual escalada da neurologia. O contrário pode ser mais próximo à verdade: a escalada da neurologia sustenta o motivo do aumento da atenção que tem sido dada ao autismo" (Ibid).

Sujeito cerebral e neurocultura

O contexto geral que permite compreender o surgimento e difusão dos movimentos de neurodiversidade é o contexto da cultura somática ou da biossociabilidade,33ao qual já aludi neste texto, e mais especificamente da neurocultura e do sujeito cerebral. Na biossociabilidade a vida psíquica é descrita segundo predicados corporais. Todo um vocabulário fisicalista-reducionista é utilizado na descrição de crenças, sentimentos, desejos, volições: Os atos psicológicos têm sua origem em causas físicas e as aspirações morais do indivíduo são medidas segundo performances corporais. Como conseqüência, conceições psicológicas e internalistas de pessoa são deslocadas para a exterioridade dando lugar à constituição de identidades somáticas, as bioidentidades (Ortega, 2007).

Nesse processo de descrição da individualidade e subjetividade em termos corporais o cérebro ocupa um lugar privilegiado dando lugar à descrição de crenças, desejos, comportamentos e emoções em termos cerebrais, ou neuroquímicos, tal como encontramos,

32 A comunidade científica defende atualmente os seguintes fatores causais na etiologia do autismo: predisposição genética, explicações neuroquímicas, explicações baseadas em vacinas, toxinas ambientais e teorias nutricionais (Feinberg & Vacca, 2000: 131)

33 Uso o termo em sentido mais amplo que o de Paul Rabinow (1992), que o usa para analisar as implicações sócio-culturais e políticas da genética e do projeto Genoma.

22

por exemplo, no romance de Jonathan Franzen As correções (The corrections). Nikolas Rose (2003) define este processo usando o termo ‘self neuroquímico’ (neurochemical self), isto é, a formação neuroquímica da pessoa. O termo "sujeito cerebral" (Vidal, 2005, Vidal & Ortega, 2006 Ehrenberg, 2004) resume adequadamente a redução da pessoa humana ao cérebro: a crença de que o cérebro é a parte do corpo necessária para sermos nós mesmos, no qual se encontra a essência do ser humano, ou seja, a identidade pessoal entendida como identidade cerebral. Indagar acerca do sujeito cerebral é tentar responder a pergunta de por que a afirmação ‘ eu sou meu cérebro’ tornou-se auto-evidente. O sujeito cerebral constitui uma figura antropológica privilegiada na biossociabilidade. Vários historiadores das neurociências ressaltam que o destaque dos conhecimentos neurocientíficos e das descrições subjetivas segundo o vocabulário dos saberes cerebrais, isto é, a cerebralização da identidade pessoal, não ocupa um lugar tão destacado na nossa cultura devido ao progresso alucinado das tecnologias neurocientíficas (e mais especificamente de imageamento cerebral), nem à importância do cérebro na localização de processos cognitivos e emocionais (Hagner & Borck, 2001). A cerebralização da subjetividade deve ser entendida no contexto da cultura das bioidentidades, na qual o chamado ‘programa forte’ das neurociências (Ehrenberg, 2004) - que, fundindo neurociência e psiquiatria, identifica conhecimento de si e conhecimento do cérebro, mente e cérebro, e transforma o cérebro em ator social - possui cada vez maior aceitação.

O sujeito cerebral dá lugar à aparição de práticas de si cerebrais, as neuroasceses, isto é, discursos e práticas de como agir sobre o cérebro para maximizar a sua performance, que levam a formação do que vou chamar de neurossociabilidades e neuroidentidades. O objetivo é a formação de ‘selves objetivos’, de ‘autoconstituição objetiva’ (objective self-fashioning), usando a expressão do antropólogo Joseph Dumit (2004) para se referir ao processo de formação de um self objetivo, ou seja, uma categoria de pessoa desenvolvida mediante conhecimento expert. É um processo duplo, por um lado, a ciência produz fatos que definem objetivamente quem somos; por outro, os indivíduos formam seus próprios modelos de self a partir dos fatos científicos. Na sociedade contemporânea é preciso levar em consideração diferentes fatores na formação de ‘selves objetivos’, tais como o papel desempenhado atualmente pela mídia, as tecnologias de visualização médica, o programa ‘forte’ das neurociências, a industria de psicofármacos, entre outros.34 Tampouco podemos esquecer o papel fundamental da cultura somática, na qual, como foi ressaltado, as formas de subjetivação corporais ocupam cada vez mais o lugar de formas internalistas e intimistas de construção e descrição de si, próprias de culturas mais psicológicas. Isso faz uma grande diferença, criando um contexto cultural propício para as formas de subjetivação favoráveis e a constituição de neuroidentidades, fornecendo à neurossociabilidade (que inclui os movimentos de neurodiversidade) uma visibilidade crescente.

Na cultura somática da biossociabilidade, a neurossociabilidade está ocupando cada vez um espaço maior. Encontramos por um lado todo um mercado crescente de produtos que incluem: best-sellers de auto-ajuda cerebral, softwares e programas de ‘brain-fitness’ para o computador que constituem verdadeiras ‘academias para o cérebro’ (brain gyms), vitaminas

34 A bibliografia sobre o tema é imensa. Ver, entre outros, Ackerman, 2006; Dumit, 2003, 2004; Ehrenberg, 2004; Ellis, 2006; Healy, 2002; Joyce, 2005; Rodriguez, 2006; Rose, 2005; Rose, 2006; Valenstein, 1998.

23

e todo tipo de suportes alimentares para aprimorar a performance cerebral (Brownlee, 2006a, 2006b; CBS, 2006; Singer, 2005; Ortega, 2006).

Por outro lado, o sujeito cerebral vem se tornando um critério biossocial de agrupamento, como podemos constatar no surgimento, entre outros, de:

a) Grupos que se reúnem para testar as performances cerebrais, como se depreende da existência de ‘clubes do cérebro’, ‘Campeonatos Mundiais de Memória’ e ‘Olimpíadas de esportes da mente’, promovidas pelo empresário Tony Buzan, criador dos mapas mentais e autor de numerosos best-sellers de auto-ajuda cerebral.35 Neles, os cérebros são submetidos a verdadeiras competições mentais, que incluem desde jogos mentais clássicos à exercícios para medir pensamento criativo, velocidade de leitura ou cálculos mentais e de memória.

b) Neurocomunidades como a Braingle Community36, orientada para um público adolescente e que abrangem fóruns de discussão, "talk boxes’ permitindo conversas privadas, e serviço de ‘live chat’. Os neuro-usuários podem fazer observações sobre assuntos cerebrais, comentar os novos jogos, puzzles e ‘Brain Teasers’ para promover a atividade cerebral. Ao mesmo tempo, a comunidade tem acesso a todo um ‘mercado’ cerebral. Uma industria ‘neuro’ está surgindo para compras on-line que não só inclui livros, jogos, videogames, mas também camisetas, bonés, canecas, mousepads, neurocalendários entre outros, que ajudam a delinear a identidade coletiva das novas neurocomunidades. Nesse sentido, os recursos para crianças são descomunais, como podemos constatar ao digitar as palavras "neuroscience for kids’ em qualquer mecanismo de busca na internet.

c) Grupos de apoio para portadores de diferentes doenças e transtornos neurodegenerativos e seus familiares, tais como doença de Alzheimer, esquizofrenia, doença de Parkinson, esclerose múltipla, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), demência Frontotemporal (Frontotemporal Dementia – FTD), Doença de Huntington (Hungtinton Disease), entre outros. As funções e objetivos desses grupos são diferentes, atendendo também as especificidades das diferenças doenças e transtornos, contemplando atividades que vão desde palestras e troca de informação e experiências até exercícios, serviços religiosos ou ajuda psicológica. Intervenções psicossociais diversas e troca de experiências podem ser dar em encontros regulares ou por meios virtuais, como Internet, com o uso de videoconferências, comunidades no yahoo, orkut, entre outros.37 As associações de pais de autistas e grupos pró-cura se inserem neste contexto. Os grupos da neurodiversidade têm também elementos em comum com esses grupos no nível de organização e de sociabilidade, embora divirjam em outros aspectos, especialmente em relação à ideologia pró-cura.

Neuro-diversidade e neurociências

35 Ver, www.buzanworld.com/biography.html (acessado em 3.06.2006); Verbete "Tony Buzan" in Wikipedia, http://en.wikipedia.org/wiki/Tony_Buzan (acessado em 3.06.2006).

36 http://www.braingle.com/community/index.php (acessado em 5.06.2006).

37 A lista de organizações e grupos de auto-ajuda e auto-advocacia em diferentes paises e continentes é enorme. Basta buscar no google grupos de auto-ajuda e auto-advocacia para as diferentes doenças e transtornos para aparecer uma lista imensa de associações.

24

Acredito que esta descrição do sujeito cerebral e da neurocultura constitui o pano de fundo para compreender a cerebralidade que está na base dos movimentos da neurodiversidade. Para esses grupos, o cérebro vem se tornando um critério biossocial de agrupamento fundamental. É nesse contexto que podemos entender a própria noção de (neuro) diversidade. Se pararmos para pensar, a junção desses dois termos ‘neuro’ e ‘diversidade’ não é autoevidente. A diferença, singularidade e diversidade são colocadas do lado cerebral. Trata-se como vimos de uma naturalização, fisicalização da identidade. Mas, como o cérebro pode ser o lugar do diverso, da diferença?, podemos perguntar. As pesquisas neurocientíficas, por exemplo, na área da psiquiatria biológica (por ser a mais próxima ao autismo) não se caracterizam precisamente pela busca de regularidades e constantes neuroanatómicas e neurofisiológicas que permitam distinguir um cérebro autista, ou um cérebro deprimido ou esquizofrênico de um cérebro normal, como mostram os estudos com neuroimagem? Não se trata de localizar no cérebro as regiões responsáveis pelos mais diversos estados mentais, normais ou patológicos? Ou seja, não se considera o cérebro como o lugar da identidade, das constâncias, das regularidades? Nesse caso não existiriam termos mais adequados para pensar a diversidade, tais como psico-diversidade (entendendo ‘psico’ não em referencia a qualquer teoria psicológica ou psicanalítica, dada a aversão dos autistas a elas, mas no sentido de ‘mental’) ou ‘mind’-diversidade (Porém, em português soa estranho o termo mente-diversidade. Talvez poderíamos pensar em ‘diversidade mental’ em oposição à ‘diversidade neural’ ou neurodiversidade)?. Afinal, é do lado do mental que podemos imaginar o diverso, o múltiplo, o singular, tantas formas de vida como a imaginação, a fantasia e a criatividade consigam pensar. Do lado corporal (cerebral) o repertório de possibilidades é finito. Tomo como exemplo a seguir o caso das modificações corporais que tenho analisado em outro lugar (Ortega, 2007).

Tatuagens, piercings, cutting, brainding, implantes subcutâneos, entre outros, constituem tentativas de dar uma localização específica e corporal à identidade subjetiva. A autenticidade, realidade, identidade e autonomia pessoal são colocadas do lado corporal. O desarraigamento social e a ausência de vínculos simbólicos e rituais coletivos próprios de nossas sociedades contemporâneas, salientados por diversos sociólogos, filósofos e historiadores, conduzem o indivíduo a se retrair sobre si e fazer de seu corpo um universo em miniatura, uma verdade sobre si e um sentimento de realidade, que a sociedade não consegue mais lhe fornecer. A modificação corporal responde a um déficit identitário, constitui uma suplência de identidade, um tipo de assinatura de si pela qual o indivíduo se afirma na identidade escolhida, que difere daquelas que são atribuídas pelo olhar do outro. Pois bem, o repertório que o indivíduo dispõe para criar uma identidade corporal, naturalizada, é finito, dado pelos próprios limites de seu corpo. Daí que surjam modificações cada vez mais radicais que incluem a amputação de diversos membros corporais, como no caso já mencionado da apotemnophilia. Chegará um momento em que a superfície (ou o interior) do corpo esteja completamente ocupada por piercings e demais marcas corporias identitárias. Ao repertório limitado de identidades corporais se opõe a riqueza infinita da identidade psicológica ou mental dada pela própria imaterialidade do mental. Isso sem mencionar o engodo psíquico que supõe localizar a identidade pessoal no corpo. Se o que somos está exposto ao olhar do outro somos privados da capacidade de fingir, de dissimular, de esconder os sentimentos, as intenções, os segredos. Somos

25

vulneráveis ao olhar do outro, mas, ao mesmo tempo, precisamos de seu olhar, de ser percebidos, senão não existimos.

O mesmo se aplica à busca da identidade e da diversidade do lado cerebral. Em primeiro lugar, vale a pena fazer uma ressalva sobre o ‘boom’ recente de teorias, práticas e produtos que exploram a ‘neuroplasticidade’, recorrente da descoberta da neurogenese em adultos.38 Embora a plasticidade cerebral desloque para o pólo cerebral características tais como multiplicidade, criatividade e singularidade,39 todavia, não acredito que a plasticidade cerebral leve a equiparar a potencialidade de possibilidades do mental com o cerebral. Ela não substitui a potencialidade de expressões subjetivas do mental. No fundo, os mais diversos estudos realizados com neuroimagem vêm corroborar esse raciocínio. A complexidade e riqueza das experiências mentais não é reduzível à simplicidade e pobreza das redes neurais ou das medidas neuroquímicas. Se, como, por exemplo, Newberg e D´aquili pretendem mostrar ao escannear o cérebro de oito budistas americanos praticantes de meditação Tibetana e de três freiras Franciscanas em oração contemplativa, que em ambos os grupos se observa aumento de atividade neural no córtex pré-frontal e diminuição de atividade no lobo parietal posterior superior (d´Aquili & Newberg, 1999; Horgan, 2003), fornecem porventura esses dados, procedentes do pólo cerebral, alguma informação importante sobre o pólo mental, para alem do fato óbvio de que (senão queremos reeditar alguma versão do dualismo clássico) toda experiência mental (inclusive as espirituais) possui correlatos cerebrais?40 Podemos identificar a experiência espiritual de vazio, o Nirvana dos budistas com o sentimento de comunhão com Deus das freiras? Seria ingênuo acreditarmos na identidade das duas. Obviamente, se tratam de duas experiências subjetivas completamente diferentes, correspondentes a duas visões do mundo, conceições teológicas e espirituais diversas e a contextos sócio-culturais distintos ainda que possuam o mesmo correlato neural. A riqueza e diversidade do pólo mental (espiritual) se perdem na pretensa redução ao pólo material, cerebral. Trata-se de uma tradução grosseira, simplificadora e ingênua. Parafraseando o título do livro de William James, as ‘variedades da experiência religiosa’ não são traduzíveis à monotonia e uniformidade de seus correlatos neurais. Um único mecanismo neural não pode nem poderá dar conta da totalidade e diversidade das experiências espirituais. Da mesma maneira, se pudessem ser delimitados os correlatos neurais da depressão, diria isso alguma coisa acerca da experiência singular do sujeito deprimido? Os cérebros deprimidos podem ser iguais, os sujeitos deprimidos com certeza não o são. Ou acaso é a mesma coisa a experiência do sujeito que está deprimido por que foi abandonado pela mulher, perdeu o emprego, ou pela violência e desigualdade da sociedade em que vive? Sem dúvida não, mas e se o correlato cerebral for o mesmo? Novamente encontramos a diversidade e a multiplicidade e a heterogeneidade do lado mental oposta a simplicidade, homogeneidade e uniformidade do lado cerebral. Ou vamos

38 A bibliografia é imensa e não para de crescer. Ver, entre outros, Li, 2003; Sailor, Ming & Song, 2006; Schwartz, & Begley, 2002; Stahnisch, 2003; Weiller & Rijntjes, 1999.

39 Um exemplo deste deslocamento é o livro de Ansermet e Magistretti (2004), no qual o conceito de plasticidade denota o caráter aberto à mudança e a contingência das redes neuronais, possibilitando uma aproximação entre psicanálise e neurociência.

40 Embora menos relevante para o argumento que estou lançando aqui, vale a pena ressaltar que, mesmo do lado dos correlatos mentais, os dados experimentais são contraditórios. Por exemplo, um estudo dinamarquês feito com indivíduos meditando mostrou um resultado oposto ao de Newberg e D´aquili, isto é, aumento de atividade nos lobos parietais e diminuição nos frontais. Ver, Andreson, 2000.

26

afirmar que é o mesmo cantar funk, música sacra ou A Internacional, ainda que do lado cerebral seja a mesma região que é ativada?

Assim caberia perguntar se, ao apostar pelo pólo cerebral para defender a diversidade e a diferença de formas de vida, não estaria o movimento da neuro-diversidade se afastando da riqueza do mundo mental, onde o que aproxima e distância os indivíduos são as visões do mundo, ideais e esperanças, compartilhadas ou não? Não estariam apostando em uma diversidade que no fundo é uma forma de homogeneidade, colocando a própria diferença do lado de uma identidade naturalizada, marcada no cérebro e, como conseqüência, de uma política da identidade? No fundo, o movimento coloca do lado do ‘neuro’ o que se costumava colocar do lado mental e social. Esse deslocamento deve ser compreendido no contexto da ideologia do sujeito cerebral em que o cérebro responde por tudo o que outrora costumávamos a atribuir à pessoa, ao indivíduo, ao sujeito. O cérebro vem se tornando na neurocultura o ator social privilegiado.

O ‘cérebro-músculo’ e o ‘cérebro-alma’

A cultura do sujeito cerebral nos fornece duas metáforas básicas para pensar o cérebro. Aparentemente contraditórias, as duas coabitam lado a lado em nossa cultura contemporânea. A metáfora do cérebro-músculo e do cérebro-alma, ou cérebro-mente.

A primeira opera em todo o conjunto de discursos e práticas neuroascéticas as que me referi acima. São discursos e práticas de como agir sobre o cérebro para maximizar a sua performance. Não pretendo me alongar neste ponto, pois é a segunda metáfora que nos interessa neste contexto. Vale mencionar que no contexto da neurocultura vem aparecendo um número crescente de best-sellers de auto-ajuda cerebral que prometem desenvolver determinadas regiões do cérebro, permitindo desde aumentar a performance do raciocínio e da memória, combater depressão, ansiedade, adições e compulsões diversas, até melhorar a performance sexual, atingir a felicidade ou estabelecer um contato direto com Deus. No mercado brasileiro encontramos entre outros os seguintes títulos: Superpoderes do cérebro; Como treinar o cérebro para realizar o impossível; Maximize o potencial de seu cérebro; Como desenvolver o poder da mente; O poder do cérebro.41 Esses best-sellers aparecem recheados de recomendações sobre exercícios cerebrais e sobre a importância do exercício físico, da dieta equilibrada e do efeito de álcool, drogas e outras toxinas no cérebro. O sujeito cerebral visa se inserir nas demandas da maximização da performance corporal da cultura corporal. Isso se mostra no uso das metáforas e analogias da fitness corporal pelos best-sellers de auto-ajuda cerebral. A própria idéia de ‘ginástica cerebral’ (brain-fitness) ou ‘neuróbica’ presente no título da maioria desses livros remete a essa analogia e nos mostra

41 Varios deles são traduções brasileiras de Smart for Life, Build Your Brain Power, Brain Power, Brain Fitness, The Executive Brain (Goldberg, 2001; Chafetz, 1992; Winter & Winter, 1987; Mark & Mark, 1991; Goldman, Klatz & Berger, 1991).

27

como o cérebro é tratado como o órgão, o músculo privilegiado que deve ser exercitado para maximizar a sua performance (Dennison & Dennison, 1989, 1994; Cohen & Goldsmith, 2002; Eiffert, 1999; Winter & Winter, 1987; Mark & Mark, 1991; Goldman, Klatz & Berger, 1991). O sujeito cerebral transpôs o vocabulário da fitness corporal para o cérebro. Na auto-ajuda cerebral os principais motivos da auto-ajuda tradicional aparecem em nova roupagem cientificista temperados com o jargão da cultura somática e das academias de ginástica (Ortega, 2006).

A metáfora do ‘cérebro-músculo’ convive paradoxalmente com a segunda metáfora do cérebro, a do ‘cérebro-alma’ ou ‘cérebro-mente’. Esta última é mais pertinente para os objetivos deste texto, pois permite compreender o deslocamento para o pólo ‘neuro’ de todos os predicados que outrora se situavam do pólo mental ou cultural ao qual acabo de aludir em relação à diversidade ‘neural’ dos movimentos de neurodiversidade. Embora os avanços na área de neurociências e da psicologia cognitiva considerem a alma uma relíquia, e mesmo a mente e a consciência apareçam nas versões mais radicais como um epifenômeno, um produto ou uma ilusão criada pelo cérebro, vemos em numerosos lugares e áreas de nossa cultura como o cérebro incorpora diversas características da alma e da mente imaterial. Sem pretender me alongar sobre esse aspecto, podemos mencionar os numerosos exemplos da ficção científica, seja literária ou cinematográfica, em que reaparece a idéia da alma imortal no modelo de um cérebro que é sucessivamente reimplantado em novos corpos, garantindo, desse modo, a continuidade indefinida da identidade do indivíduo. A imortalidade é caucionada pela preservação infinita do cérebro. De maneira semelhante, em um terreno entre a realidade e a ficção, encontramos o procedimento conhecido como ‘criogenia’, isto é, congelamento do corpo (ou o cérebro) após a morte para ser ‘ressuscitado’ quando os avanços biotecnológicos o permitam. Empresas como Alcor42oferecem os serviços de congelamento do corpo inteiro ou apenas do cérebro. O fato de a segunda opção ser oferecida pela empresa e as pessoas optarem por ela envolve a crença de que o cérebro é a parte do corpo necessária para sustentar a identidade pessoal. Os indivíduos que se submetam ao congelamento de seus cérebros estão pressupondo que vão ressuscitar como eles mesmos, mesmo seus cérebros tendo sido transplantado em outros corpos.43 Esses exemplos evidenciam a metáfora do cérebro-alma. O sujeito cerebral não superou a alma, mas incorporou as suas características (imaterialidade, imortalidade) em sua configuração atual. Pois, se por um lado, diante do aumento da longevidade, o envelhecimento crescente da população e, sobretudo, de seus cérebros prevê-se um grave problema para a saúde pública devido ao incremento das doenças neurodegenerativas, tais como as doenças de Alzheimer ou Parkinson, entre outras,44 por outro lado, os exemplos mencionados das ficções científicas, da ‘neuropreservação’, parecem querer nos dizer que o cérebro não envelhece, não adoece,

42 A empresa Alcor oferece os serviços de congelamento do corpo inteiro por US$ 120 mil, ou apenas o cérebro, uma solução que sai bem mais em conta, custando US$ 50 mil, mais taxa de transporte de US$ 20 mil. Ver, Azevedo, 2002.

43 A matéria da qual foram extraídas essas informações tem o sugestivo título de "Vida após a morte. O congelamento em busca da ressurreição tem até lista de espera" (Azevedo, 2002).

44 Esses fatos têm levado a proposta de desenvolver ‘políticas públicas cerebrais’ (brain-policies) que priorizem as pesquisas na etiologia das doenças neurodegenerativas, suas possíveis causas genéticas e ambientais e os potenciais tratamentos para dar conta do envelhecimento dos cérebros. Ver Blank, 1999.

28

não se deteriora, não morre. A despeito de ser material, carnal, como os outros órgãos do corpo, ele incorpora a imaterialidade e imortalidade da alma.45 Os atributos da alma e da mente são deslocados para o cérebro. Esse deslocamento acompanha a história da neurociência e suas tentativas de localizar a alma no cérebro (Breidbach, 1997; Hagner, 1997), que levou a dotar ao último com os atributos e características do primeiro. O cérebro é desmaterializado, é tratado como se não fosse corporal. A metáfora do ‘cerebro-alma’ ou mente reaparece nas tentativas de busca de um fundamento do universalismo ético no cérebro. Vimos como a biossociabilidade leva consigo uma perda ou resignificação de laços sociais e valores que organizavam as formas de sociabilidade mais antigas. Os critérios de agrupamento tradicional foram deslocados para o corpo: saúde, performances corporais, tipos específicos de doenças tornam-se doravante organizadores da vida social e subjetiva. O investimento no corpo (e/ou no cérebro) é uma resposta à desagregação dos laços sociais, ao afastamento do outro e a perda de valores e significados coletivos que estruturavam o mundo simbólico do indivíduo. A contingência e perda das ancoras tradicionais para o self criam um sentimento de insegurança que levam à procura da realidade na marca corporal (no caso no cérebro). Quanto mais acreditamos na contingência mais temos a necessidade de recorrer a alguma coisa que se apresente como real, como permanente em um mundo de impermanência, um suporte para o self. Nessa época de fragmentação pós-moderna, o cérebro se apresenta como o último universal, a última grande narrativa após o final das grandes narrativas, um fundamento inexorável no qual basear nossas escolhas morais e comportamentais. Senão como vamos a entender a observação de Steven Pinker de que o imperativo ético se segue do "fato inegável de que todos nós somos feitos da mesma carne neural torna impossível negar nossa capacidade comum para sofrer?" (minha ênfase), Isto é, os problemas entre judeus e palestinos (o exemplo é dele) poderiam se resolver se levarmos em conta que ambos têm cérebros. Se o outro tem um cérebro como eu, então eu não posso matá-lo; "uma vez percebido que nossa consciência é um produto de nossos cérebros e que outras pessoas têm cérebros como o nosso, a negação da sentiencia em outras pessoas torna-se absurda." (Pinker 2007: 47). Pinker não está sozinho nesta empreitada. O filósofo Josua Green afirma "poder ver o intuicionismo social em ação no cérebro" (Zimmer, 2004: 325); e o neurocientista Gazzaniga, por sua vez, na busca de uma ética universal, localiza no cérebro os centros de raciocínio moral correspondentes às diferentes abordagens éticas: a deontologia kantiana enfatizaria a região frontal do cérebro; as regiões pré-frontais, límbicas e sensoriais (sensory) seriam responsáveis pelo utilitarismo de John Stuart Mill e ação coordenada de todas as regiões pela teoria das virtudes de Aristóteles (Gazzaniga, 2005).

A idéia do cérebro como o lugar da ‘universalidade’, isto é, o requisito essencial para o reconhecimento da humanidade e dos direitos do outro, como no caso de Steven Pinker, convive com, e freqüentemente pressupõe a idéia de um ‘cérebro universal’, isto é, a existência de uma estrutura ou modelo cerebral considerado normal, ideal, e desejável que

45 Os fenomenólogos têm chamado a atenção para a base experiêncial da noção de cérebro imaterial, pois o cérebro não é accessível à apreensão consciente; é impermeável ao toque. Não sentimos quando nosso cérebro é tocado ou estimulado. Essa experiência singular do cérebro, que impede o seu acesso em primeira pessoa, corrobora fenomenologicamente a tendência de deslocar para ele os atributos da mente ou alma. Drew Leder (1990) escreve a este respeito que "a invisibilidade do cérebro é uma origem experencial da noção de que a mente humana é imaterial" (1990: 115). Onde se lê ‘mente’ (mind) poderíamos colocar ‘cérebro’ (brain). Obviamente esta constatação fenomenológica se contrapõe à noção do ‘cérebro-músculo’, à que aludi acima. No entanto, ambas coexistem na nossa cultura, aparentemente de maneira harmônica.

29

vêm sendo criticada pelos ativistas autistas. Eles acreditam que essa noção leva a tentativas de normalização cerebral; qualquer desvio requereria uma ‘cura’ que permitisse atingir a norma cerebral neurotípica.46 Todavia, não é apenas um fundamento para a universalidade ética, social, mental ou neural que é procurado no cérebro. Busca-se também o fundamento para o particularismo, a singularidade e a diferença ética, social e neural. Acaso não é exatamente nessa idéia que se baseiam os movimentos da neurodiversidade quando exigem tolerância e respeito diante das ‘diferenças naturais no cérebro’, da ‘riqueza e complexidade (...) do cérebro humano’ (Armstrong, 2005)? Dependendo dos mais diversos interesses éticos, sociais, políticos ou psiquiátricos recorre-se ao cérebro na busca de um embasamento fundamento universal, seja este ético, social, ou neural, que permita impor modelos de cura e normalidade para os que divergem desse padrão. Concomitantemente, o mesmo cérebro encerra o fundamento da singularidade e da diversidade. Os grupos pró- e anticura se colocam nos dois pontos do espectro, buscando quer uma estrutura ideal ‘neurotípica’ quer diferenças naturais no cérebro capazes de embasar científica e neuralmente seus objetivos políticos. Essa história não é nova como ressaltam diversos historiadores da neurociência (Hagner, 2004; Harrington, 1987). Desde o século XIX, o cérebro carrega os mais diversos significados morais, sociais, econômicos, políticos e teológicos, como se depreende da busca pela inscrição neural de criminalidade, genialidade ou loucura, que se estende desde a antropologia física e racial oitocentista - a qual buscava justificar neuralmente hierarquias e diferenças sociais e raciais -, até o escrutínio dos cérebros de Lênin, Einstein ou da terrorista alemã da RAF , Ulrike Meinhof, na procura da genialidade ou da propensão para o terror.47 Desde então, vem se buscando quer na ‘estrutura ideal’ ou quer nas ‘diferenças naturais’ no cérebro justificativas científicas para classificar, hierarquizar e normalizar os indivíduos, ou mais recentemente, para a defesa do direito à diferença.

Os movimentos da neurodiversidade surgiram, como já foi assinalado no início do texto, no contexto do paradigma constructivista imperante nos disability studies, segundo o qual, deficiência e doença não são fatos biológicos, mas construções sócio-culturais visando regulamentar os corpos e os cérebros (Davis, 1995). Uma posição que é compartilhada pela chamada ‘psiquiatria pós-moderna’, crítica da substituição da compreensão sócio-cultural, política e religiosa da doença mental pelo paradigma psicopatológico e neurocientífico. Ela descarta qualquer dimensão cientificista da psiquiatria que procure correlações entre transtornos mentais e lesões cerebrais (Brendel, 2006). Resulta paradoxal que, exatamente nesse modelo construtivista, a neurodiversidade organize a identidade em torno a algo tão pouco construído e tão biológico como é o cérebro. A cerebralização da identidade e da sociabilidade representa uma posição materialista que envolve uma naturalização e fisicalização extrema, nas antípodas da construção. Para o movimento da neurodiversidade, o cérebro não é uma construção social.

46 Ver a entrada "Autistic Pride Day" em Wikipedia, op. cit.

47 Sobre o cérebro dos gênios, ver o excelente livro de Hagner (2004); ver também Burrell, 2004. Sobre diferenças raciais e sociais no cérebro desde o século XIX e a antropologia física e racial, ver o clássico livro de Gould (1981). Ver também Hecht, 2003, Harrington, 1987. A história do cérebro de Lênin e de Oskar Vogt, o famoso neurologista alemão que examinou o cérebro do líder revolucionário após a sua morte é contada em forma de romance por Spengler (1991). Para um tratamento mais rigoroso, ver Hagner, 2004. Sobre o cérebro de Einstein, ver Paterniti, 2000; Abraham, 2001; Hagner, 2004. Sobre o cérebro de Ulrike Meinhof ver Dahlkamp, 2002a, 2002b; Hagner, 2004.

30

Coexistem no movimento o impulso construtivista e a naturalização identitária. Novamente se coloca o direito à diferença do lado de predicados biológicos, de uma identidade marcada no cérebro.

Rumo a uma política identitária

Com isso, entramos no último ponto que gostaria abordar nesse texto e que constitui o maior desafio para os movimentos da neurodiversidade: a tentação da ‘política identitária’. Ao colocar o direito à diferença do lado biológico (cerebral) o movimento da neurodiversidade corre o risco de cair em uma política identitária calcada em predicados naturais, que leve a uma redução da pluralidade à identidade e que homogeneize as diferenças, suprimindo a singularidade dentro do próprio movimento. Sirva a advertência que Agnes Heller fez acerca do movimento feminista radical do perigo da homogeneização do grupo qua diferença: "Os que falam em nome das mulheres se colocam no lugar de todas as mulheres, da metade da humanidade, enquanto que as mulheres podem ter e de fato têm aspirações totalmente diferentes e imagens de si completamente divergentes; possivelmente recusam a imagem prescrita por feministas radicais".48 Para dizer a verdade, nos debates entre os grupos pró-cura e o movimento autista anticura reconhecemos, no tom e nos argumentos e na pretensão de falar em nome de todos os autistas, a descrição que Heller faz dos movimentos biopolíticos. "No discurso biopolítico", escreve a filósofa húngara, "os grupos autodefinidos determinam também as condições às contribuições dos outros. Um discurso que ‘desmascara’ outros discursos, que trata com desconfiança o diferente, não é em realidade público. Todas as raças e ambos os sexos encontram aqui sua própria verdade; e quanto mais poderosos são seus lobbys mais enfaticamente tentam proclamar sua verdade como incontestável e absoluta. As opiniões divergentes não são aceitas, e as opiniões contrárias não são ouvidas" (Ibid.).

Alguns teóricos dos ‘estudos sobre deficiência’ vêm chamando a atenção para o perigo de que a auto-estima de ser deficiente esteja relacionada com a comparação e a hostilidade com os não-deficientes (Swain & Cameron, 1999), e, frente a uma idéia de comunidade fechada, calcada em uma política identitária reducionista, propõem criar comunidades mais abertas e democráticas (Corker, 1999c). Essa autocrítica tem sido feita recentemente no interior do próprio movimento da neurodiversidade. Jim Sinclair (2005) recriminou o preconceito de certos autistas contra os neurotípicos. E a própria Judy Singer, que impulsionou e deu grande visibilidade ao movimento, reconheceu recentemente que o movimento está caminhando para o ‘lado escuro’ da política identitária com "sua eterna vitimização, infantilidade, sua demanda por amor incondicional e aceitação sem uma auto-reflexão adulta concomitante, um autocriticismo, uma medida de estoicismo e desejo para ver luz e escuro em si próprio, assim como no ‘o Outro’".49

Singer faz ao mesmo tempo uma outra crítica que é fundamental para compreender o papel da ontologia do sujeito cerebral e da neurocultura nos movimentos da neurodiversidade. A cerebralização da identidade é assumida sem questionamento pelo movimento, como vimos. A ativista australiana ressalta que a chamada revolução

48 Heller (1995). Ver também Feher & Heller (1994).

49 Singer (2007). Sou muito grato a Enrico Valtellina por ter chamado minha atenção para este texto, fundamental para meu argumento.

31

neurocientífica não só traz vantagens e que os autistas precisam ter uma visão mais equilibrada sobre o impacto das neurociências sobre a vida e o destino das pessoas, autistas ou não. Estamos dispostos a pagar o preço exigido por nos definirmos cerebralmente? O sujeito cerebral não sugere apenas a idéia de conexões cerebrais diferentes e atípicas, que não devem ser patologizadas nem normalizadas. Ele implica em formas de subjetivação, isto é, relações consigo e com os outros enquanto sujeitos cerebrais. Isto remete a visões reducionistas e empobrecidas da vida subjetiva e relacional, nas quais o cérebro responde por tudo o que outrora costumávamos a atribuir à pessoa, ao indivíduo, ao ambiente e à sociedade, com conseqüências severas em diversas esferas socioculturais e clínicas, entre elas, o perigo das políticas identitárias reducionistas e as explicações da depressão e de outros transtornos e doenças mentais em termos exclusivamente cerebrais, ignorando os fatores ambientais e sociais, fornecidas pela psiquiatria biológica aliada à indústria farmacêutica. É preciso saber se queremos pagar esse preço.

Tentei neste texto mostrar alguns dos desafios que apresentam os movimentos da neurodiversidade. Meu objetivo principal não era tomar partido a favor ou contra os grupos pró- ou anticura, pois acredito que ambos têm suas razões. Os primeiros ao criticar as políticas identitárias agressivas praticadas por ativistas radicais do movimento autista que pretendem falar em nome de todos os autistas.50 Os ativistas autistas são freqüentemente autistas de ‘alto funcionamento’, geralmente Aspergers, que se outorgam o direito de manifestar-se em nome de todos os autistas, o que causa irritação dos pais de filhos autistas de ‘baixo funcionamento’ com grave retardo físico. Obviamente seria hipocrisia subsumir todas as formas de autismo ao ‘alto funcionamento’, para depois dizer, que autismo é um estilo de vida. O movimento da neurodiversidade é minoritário dentro do espetro total do autismo. Muitos autistas não possuem nem a capacidade cognitiva de falar nem dizer o que pensam ou sentem quanto menos de se organizar política e comunitariamente. Os ativistas autistas, por sua vez, têm suas razões ao temer políticas igualmente agressivas que incluam testes genéticos que possibilitem abortar fetos autistas, bem como a imposição de ideais e padrões de normalidade cerebral, que redundem em terapias e obrigação de ser ‘curados’. Se o autismo é um espectro, não pode ser tratado como uma entidade nosológica fechada. Seu alcance e limites exigem uma constante negociação pública. Qualquer decisão acerca de um ponto de corte ao longo do espectro do transtorno autista será sempre arbitrária, resultado de interesses e lobbys de determinados grupos. Ou, porventura acreditamos que existem critérios objetivos que permitam estabelecer um ponto de corte no espectro a partir do qual os indivíduos possuiriam ou não uma ‘teoria da mente’ (Baron-Cohen, 1995; Frith, 1991) ou as ‘condições de selfhood’ (Glannon, 2007), e assim tomar decisões objetivas acerca da imposição de terapias ou testes genéticos (no caso dos fetos), ou que possibilitassem atribuir aos indivíduos uma autonomia e responsabilidade pelas suas ações?

Queria apenas mostrar esses impasses e embates no seio da neurocultura no qual o movimento da neurodiversidade é uma manifestação, e mostrar como uma ideologia solipsista, reducionista e cientificista - como é o sujeito cerebral - pode servir de base para a formação de identidade e de redes de sociabilidade e comunidade. Poderíamos parafrasear Foucault e afirmar que todo dispositivo de saber-poder é um mecanismo de assujeitamento mas ao mesmo tempo abre a possibilidade da resistência. O desafio do movimento da

50 Justiça seja feita, a autocrítica está começando a ser realizada no seio do movimento da neurodiversidade.

32

neurodiversidade oscila entre a aposta em políticas identitárias que são meros epifenômenos do sujeito cerebral ou procurar alternativas a esta ideologia simplificadora da vida subjetiva e relacional.

BIBLIOGRAFIA

Abraham, Carolyn (2001), Possessing Genius. The Bizarre Odyssey of Einstein´s Brain. New York, St. Martin´s Press.

Ackerman, Sandra J. (2006) Hard science, hard choices. Facts, ethics and policies guiding brain science today. New York, Dana Press.

Aïach, Pierre (1998), "Les voies de la médicalisation", In Aïach, Pierre e Delanoë, Daniel (Orgs.) L’`ere de la médicalisation. Ecce homo sanitas. Paris, Ed. Economica, pp. 15-36.

Andreson, Jensine (2000), "Meditation Meets Behavioral Medicine", Journal of Consciousness Studies, vol.7, no. 11-12: 17-73.

Ansermet François et Magistretti Pierre (2004), A chacun son cerveau. Plasticité neuronale et inconscient, Paris, Odile Jacob.

Antonetta, Susanne (2005) A mind apart. Travels in a Neurodiverse World, Tarcher, Penguin.

Armstrong, Thomas (2005), "Special Education and the Concept of Neurodiversity", In http://www.newhorizons.org/spneeds/inclusion/information/armstrong.htm (acessa do em 04/12/2006).

"Autism rights movement", in Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Autism_rights_movement (acessado em 20.05.2007).

"Autistic Pride Day" em Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Autistic_Pride_Day (acessado em 16.06.2007).

Azevedo, Natalia (2002), "Vida após a morte. O congelamento em busca da ressurreição tem até lista de espera", Revista ISTO É, 19/07/2002, In: http://www.terra.com.br/istoe/1712/ciencia/1712_vida_apos_a_morte.htm (acessado em 6/08/2004).

Baker, Dana Lee (2004). "Borders, Barriers, and Brains: Issue Definition in Rights Based Policy Related to Autism", Report 43-2004 [Working Paper]. Retrieved from University of Missouri – Columbia, Institute of Public Policy Web site: http://www.truman.missouri.edu/ipp/publications/workingpapers.html (acessado em: 1.06.2007).

Baker, Dana Lee (2006). "Neurodiversity, neurological disability and the Public Sector: Notes on the Autism Spectrum", Disability & Society, 21(1), pp. 15-29.

Baron-Cohen, Simon (1995), Mindblindness: An Essay on Autism and Theory of Mind. Cambidge,Massachusetts: MIT Press.

_________________ (2000), "Is asperger syndrome/high-functioning autism necessarily a disability?", Development and Psychopathology. Summer;12(3):489–500.

33

______________ (2002), "The extreme male brain theory of autism", TRENDS in Cognitive Sciences Vol.6 No.6 June 2002, pp. 248-254.

Bettelheim, Bruno (1967), The Empty Fortress. New York, Free Press, 1967.

Blank, Robert H. (1999), Brain Policy. How the New Neuroscience Will Change Our Lives and Our Politics. Washington, D.C., Georgetown University Press.

Blume, Harvey (1997), " ‘Autism & The Internet’ or ‘It's The Wiring, Stupid’", http://web.mit.edu/comm-forum/papers/blume.html (acessado em 26/6/2007).

Breidbach, Olaf (1997), Die Materialisierung des Ichs. Zur Geschichte der Hirnforschung im 19. und 20. Jahrhundert. Frankfurt, Suhrkamp.

Brendel, David (2006), Healing Psychiatry: Bridging the Science/Humanism Divide, Cambridge, Mass. and London, The MIT Press.

Brownlee, Christen (2006a), " Buff and Brainy. Exercising the body can benefit the mind", Science News Online, 25.2.2006, In, http://www.sciencenews.org/articles/20060225/bob10.asp (acessado em 1.06.2006).

Brownlee, Christen (2006b), " Eat Smart. Foods may affect the brain as well as the body", Science News Online, 4.3.2006, In, http://www.sciencenews.org/articles/20060304/bob8.asp (acessado em 1.06.2006).

Bunton, Robin (1997), "Popular health, advanced liberalism and Good Housekeeping", In Petersen, Alan e Bunton, Robin (Orgs.) Foucault, Health and Medicine. London, Routledge, pp. 223-248.

Burrell, Brian (2004). Pictures from the Brain Museum. The Improbable Search for Meaning in the Matter of Famous Minds. New York, Broadway.

Caplan, Arthur (2005), "Would you have allowed Bill Gates to be born? Advances in prenatal genetic testing pose tough questions", http://www.msnbc.msn.com/id/7899821 (acessado 9.06.2007).

Cavalcanti, Ana Elizabeth e Rocha, Paulina Schmidtbauer (2001), Autismo. Construções e desconstruções. São Paulo, Casa do Psicólogo.

Caversan, Luiz (2005), "Viva a diferença", Folha OnLine, 04/06/2005, In http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/ult513u195.shtml (acessado em 14/12/2006).

CBS (2006), "Retraining The Brain. Doctors Test Drug-Free Methods To Restore Lost Mental Capabilities", CBS NEWS, Jan. 15, 2006, In, http://www.cbsnews.com/stories/2006/01/15/sunday/main1209916.shtml (acessado em 1.06.2006).

Chafetz, Michael D. 1992. Smart for Life: How to Improve Your Brain Power at Any Age (Paperback), Penguin.

Cheu, Johnson (2004), "De-gene-erates, Replicants and Other Aliens: (Re)defining Disability in Futuristic Film", In Corker, Mairian and Shakespeare, Tom (Eds.), Disability/Postmodernity. Embodying disability theory. London, New York, Continuum, pp. 198-212.

Cohen, Isabel & Goldsmith, Marcelle. 2002. Hands on: How to Use Brain Gym in the Classroom, Edu Kinesthetics.

Conrad, Peter (1995), "Médicalisation et contrôle social", In Bouchard, Luise e Cohen,

34

David (Orgs.) Médicalisation et contrôle social, Les cahiers scientifiques de l’Acfas, 84, Quebec, pp. 9-31. Corker, Mairian and French, Sally (Eds.) (1999a) Disability discourse. Buckingham, Philadelphia, Open University Press.

Corker, Mairian and French, Sally (1999b), "Reclaiming discourse in disability studies", In Corker, Mairian and French, Sally (Eds.), Disability discourse. Buckingham, Philadelphia, Open University Press, pp. 1-11.

Corker, Mairian (1999c), "New disability discourse, the principle of oftimization and social change", In, Corker, Mairian and French, Sally (Eds.), Disability discourse. Buckingham, Philadelphia, Open University Press, pp. 192-209.

Corker, Mairian and Shakespeare, Tom (Eds.) (2004a), Disability/Postmodernity. Embodying disability theory. London, New York, Continuum.

Corker, Mairian and Shakespeare (2004b), "Mapping the terrain", In Corker, Mairian and Shakespeare, Tom (Eds.), Disability/Postmodernity. Embodying disability theory. London, New York, Continuum, pp. 1-17.

Crawford, Robert (1980), "Healthism and the medicalization of everyday life", International Journal of Health Services, vol.10,3, pp. 365-388.

_____________ (1994), "The boundaries of the self and the unhealthy other: reflections on health, culture and aids", Social Sciences and Medicine, vol.38, 10, pp. 1347-1365.

"Cure autism now", Wikipedia , http://en.wikipedia.org/wiki/Cure_Autism_Now (acessado em 1.06.2007).

D´Aquili, Eugene & Newberg, Andrew B. (1999), The Mystical Mind: Probing the Biology of Religious Experience (Theology and the Sciences). Minneapolis, Augsburg Fortress Publishers.

Dahlkamp, Jürgen (2002a), "Das Gehirn des Terrors", Spiegel Online, 08.11.2002.

_____________ (2002b), "Tote Winkel", Der Spiegel, 47: 70-72.

Davis, Lennard J. (1995), Enforcing Normalcy. Disability, Deafness and the Body. London, New York, Verso.

Davis, Lennard J. (2000), "Bending Over Backwards: Disability, Narcissism, and the Law", Berkeley Journal of Employment & Labor Law, vol.21: 193, pp. 193-212.

Dawson, Michele (2004), "The Misbehaviour of behaviourists", In http://web.archive.org/web/20051205014407/www.sentex.net/~nexus23/naa_aba.html (acessado em 02.06.2007)

Dekker, Martijn (2006), "On our own terms: Emerging Autistic Culture", http://autisticculture.com/index.php?page=articles (acessado em 05.12.2006).

Dennison, Paul E. & Dennison, Gail E. 1989. Brain Gym (Teachers Edition) , Edu-Kinesthetics, Inc.; Tchrs/Rev edition.

Dennison, Gail E., Dennison, Paul E. & Teplitz, Jerry V. 1994. Brain Gym for Business: Instant Brain Boosters for On-The-Job Success, Edu-Kinesthetics, Inc.

Dolnick, Edward (1998), Madness on the couch. Blaming the Victim in the Heyday of Psychoanalysis. New York, Simon & Schuster.

Druhle, Marcel e Clément, Serge (1998), "Enjeux et formes de la médicalisation: d’une approche globale au cas de la gérontologie", In Aïach, Pierre e Delanoë, Daniel (Orgs.) L’`ere de la médicalisation. Ecce homo sanitas. Paris, Ed. Economica, pp. 69-96.

35

Dumit, Joseph (2003), "Is It Me or My Brain: Depression and Neuroscientific Facts", Journal of Medical Humanities 24 (2003): 35-48.

___________ (2004), Picturing Personhood. Brain Scans and Biomedical Identity, Princeton, Princeton University Press.

Ehrenberg, Alain. "Le sujet cerebral", Esprit, 309, Novembre 2004, pp. 130-155.

Eiffert, Stephen D. 1999. Cross-Train Your Brain: A Mental Fitness Program for Maximizing Creativity and Achieving Success, Amer Management Assn.

Elliott, Carl (2003), Better than Well. American Medicine Meets the American Dream. New York and London, W.W. Norton & Company.

Ellis, Judy (Org.) (2006), Neuroethics. Defining the issues in theory, practice, and policy. New York, Oxford University Press, 2006.

Faure, Olivier (1998), "La médicalisation vue par les historiens", In Aïach, Pierre e Delanoë, Daniel (Orgs.) L’`ere de la médicalisation. Ecce homo sanitas. Paris, Ed. Econômica, pp. 53-68.

Feinberg, Edward and Vacca, John (2000), "The Drama and Trauma of Creating Policies on Autism: Critical Issues to Consider in the New Millenium", Focus on Autism and other Developmental Disabilities, vol. 15, no. 3, Fall 2000, pp. 130-137.

Fombonne, Eric (2003), "Modern Views on Autism", Canadian Journal of Psychiatry, vol. 48, No.8: 503-506.

Foucault, Michel (1999), Les anormaux. Cours au Collège de France, 1974-1975. Paris, Seuil/Gallimard. Hautes Études.

Franzen, Jonathan (2001), The corrections, New York, Farrar, Straus & Giroux.

Freeman, B.J. & Cronin, Pegeen (2002), "Diagnosing Autism Spectrum Disoder in Young Children: An Uptade", Infants and Young Children, 14 (3): 1-10.

Frith, Uta (Ed.) (1991). Autism and Asperger Syndrome. Cambridge: Cambridge University Press.

Gazzaniga, Michael S. (2005), The Ethical Brain. New York, Dana Press.

Glannon, Walter (2007), Bioethics and the brain. New York, Oxford University Press.

Goldberg, Elkhonon. 2001. The executive brain: frontal lobes and the civilized mind, Oxford [u.a.]: Oxford Univ. Press.

Goldman, Robert; Klatz, Ronald & Berger, Lisa. 1991. Brain Fitness (Anti-aging Strategies for Achieving Super Mind Power) , Doubleday.

Gould, Steven J. (1981), The Mismeasure of Man. New York, W. W. Norton.

Greco, Monica (1993), "Psychosomatic subjects and the ‘duty to be well’: personal agency within medical rationality", Economy and Society, vol.22, 3, pp. 357-372.

Hacking, Ian, "What is Tom saying to Maureen?", London Review of Books , vol.28, no.9, 11.05.2006. Disponível em http://www.lrb.co.uk/v28/n09/hack01_.html (acessado em 10.05.2007).

Hagner, Michael (1997), Homo cerebralis. Der Wandel vom Seelenorgan zum Gehirn. Berlin, Berlin Verlag.

36

____________ (2004), Geniale Gehirne. Zur Geschichte der Elitenhirnforschung. Berlin, Wallstein.

Hagner, Michael, and Borck, Cornelius. (2001). "Mindful Practices: On the Neurosciences in the Twentieth Century," Science in Context, 14, 507-510.

Harmon, Amy (2004a), "Adults and Autism; An Answer, but Not a Cure, for a Social Disorder", New York Times, April 29, 2004.

___________ (2004b), "Neurodiversity Forever; The Disability Movement Turns to Brains", New York Times, May 9, 2004.

____________ (2004c), "How About Not ‘Curing’ Us, Some Autistics Are Pleading", New York Times, December 20, 2004.

Harrington, Anne (1987), Mind, Medicine, and the Double Brain. A Study in Nineteenth-century Tthought. Princeton, Princeton University Press.

Healy, David (2002) The Creation of Psychopharmacology. Cambridge, MA: Harvard

University Press.

Hecht, Jennifer Michael (2003), The End of the Soul: Scientific Modernity, Atheism, and Anthropology in France. New York: Columbia University Press.

Heller, Agnes (1995), "Achtung Europa!, Über die Biologisierung des Politischen",

In, www.hannah-arendt.de/verein/publikationen_heller.html (acessado em 1/05/2004).

Feher, Ferenc & Heller, Agnes (1994), Biopolitics. Aldershot: Avebury.

Horgan, John (2003), Rational Mysticism. Dispatches from the border between science and spirituality. Boston and New York, Houghton Mifflin Company.

Joyce, Kelly (2005), "Appealing Images: Magnetic Resonance Imaging and the Production of Authoritative Knowledge," Social Studies of Science, 35, 437-462.

Kanner, Leo (1943), "Autistic Disturbances of Affective Contact", Nervous Child 2: 217-250.

Lage, Amarílis (2006a), "Movimento diz que autismo não é doença", Folha OnLine, 27/07/2006, http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u4159.shtml (acessado em 14/12/2006).

____________ (2006b), "Autistas usam remédios para controlar aspectos da doença", Folha OnLine, 27/07/2006, http://www1.folha.uol.com.br/folha/equilibrio/noticias/ult263u4160.shtml (acessado em 14/12/2006).

Leder, Drew (1990), The absent Body, Chicago and London, The University of Chicago Press.

Li, Shu-Chen (2003), "Biocultural Orchestration of Developmental Plasticity Across Levels: The Interplay of Biology and Culture in Shaping the Mind and Behavior Across the Life Span", Psychological Bulletin, Vol. 129, No. 2: 171–194.

Luhrmann, T.M. (2000), Of 2 Minds: The growing disorder in American psychiatry. New York, Alfred A. Knopf.

37

Mark, Vernon H. & Mark, Jeffrey P. 1991. Brain Power: A Neurosurgeon's Complete Program to Maintain and Enhance Brain Fitness Throughout Your Life, Houghton Mifflin; Reprint edition.

Morris, David (2000), Illness and culture in the postmodern age. Berkeley and Los Angeles, University of California Press.

Nelson, Amy (2004), "Declaration From the Autism Community That They Are a Minority Group", November 18, 2004, In: http://www.prweb.com/releases/2004/11/prweb179444.htm (acessado em 05.12.2006).

Newschaffer CJ , Curran LK (2003). "Autism: An emerging public health problem", Public Health Rep 118(5), 2003:393-399.

Nogueira, Tânia (2007), "Um novo olhar sobre o autismo", ÉPOCA, 11.06.2007, pp. 76-85. Disponível em

http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG77644-8055-473-1,00.html (acessado em 11.06.2007).

Oliver, Mike (1990), The Politics of Disablement. London, The Macmillan Press.

Ortega, Francisco (2006), "Cérebro Best-Seller", O GLOBO - caderno PROSA & VERSO, Rio de Janeiro, 29 jul. 2006, p. 5 - 5 .

_______________ (2007), O corpo incerto. Corporeidade, tecnologias médicas e cultura contemporânea, Rio de Janeiro, Garamond.

Ortega, Francisco e Vidal, Fernando (2006). "O sujeito cerebral. Novo paradigma defende abordagem multidisciplinar para compreender a experiência humana", Scientific American Brasil, São Paulo, v. 52, 01 set. 2006. p. 20 - 20,

Paterniti, Michael (2000), Driving Mr. Albert. A Trip Across America with Einstein´s Brain. New York, The Dial Press.

Petersen, Alan (1997), "Risk, governance and the new public health", In Petersen, Alan e Bunton, Robin (Orgs.) Foucault, Health and Medicine. London, Routledge, pp.189-206.

Pinker, Steven (2007), "The Mystery of Consciousness", Time, vol. 169, No. 7, February 12, 2007: 39-46.

Pollack, Richard (1997), The creation of Dr. B. A biography of Bruno Bettelheim. New York, Simon & Schuster.

Rabinow, P. (1992), "Artificiality and enlightenment: from sociobiology to biosociality". In: Crary, J. and Kwinter, S. (orgs.) Incorporations. New York, Zone Books, pp.234-252.

Rodriguez, Paul (2006), "Talking brains: a cognitive semantic analysis of an emerging folk neuropsychology", Public understanding of science, vol. 15, no3, pp. 301-330.

Rose, Nikolas, "Neurochemical Selves", Society 41, no. 1 (2003), pp. 46-59.

__________ (2006), "Disorders Without Borders? The Expanding Scope of Psychiatric Practice", Biosocieties, vol, 1, part. 4, pp. 465-484.

Rose, Steven (2005), The future of the brain. The promise and perils of Tomorrow´s neuroscience. New York, Oxford University Press.

Rosenberg, Charles, E, (2002), "The Tyrannt of Diagnosis: Specific Entities and Individual Experience", The Milkbank Quarterly, vol. 80, No.2: 237-260.

_________________ (2006), "Contested Boundaries: psychiatry, disease, and diagnosis", Perspectives in Biology and Medicine, vol. 49, No.3:407-424.

Sacks, Oliver (2002), Vendo Vozes. Uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo, Companhia das Letras.

38

Sailor, Kurt A; Ming, Guo-li; Song, Hongjun (2006), "Neurogenesis as a potential therapeutic strategy for neurodegenerative diseases", Expert Opinion on Biological Therapy, Volume 6, Number 9: 879-890.

Schwartz, Jeffrey & Begley, Sharon (2002), The Mind and the Brain: Neuroplasticity and the Power of Mental Force. New York, HarperCollins.

Shapiro, Joseph (2006), "Autism Movement Seeks Acceptance, Not Cures", http://www.npr.org/templates/story/story.php?storyId=5488463 (acessado em 05.12.2006).

Silberman, Steve (2001), "The Geek Syndrome", Wired, Issue 9.12, Dec 2001. http://www.wired.com/wired/archive/9.12/aspergers.html (acessado 5.12.2006).

Sinclair, Jim (1993), "Don´t mourn for us", Voice, Vol.1, No.3, 1993. Disponível em: http://ani.autistics.org/dont_mourn.htlm (acessado em 05.12.2006).

Sinclair, John (2005), "Autism Network International: The Development of a Community and Its Culture", http://web.syr.edu/~jisincla/History_of_ANI.html (acessado em 05.12.2006).

Singer, Emily (2005), "Exercising the Brain. Innovative training software could turn back the clock on aging brains", Technology Review, November 21, 2005, In, http://www.technologyreview.com/InfoTech-Software/wtr_15914,300,p1.html (acessado em 1.06.2006).

Singer, Judy (1999), Why can´t you be normal for once in your life?’ From a ‘problem with no name’ to the emergence of a new category of difference". In, Corker, Mairian and French, Sally (Eds.), Disability discourse. Buckingham, Philadelphia, Open University Press, pp. 59-67.

____________ (2007), "Light and dark. Correcting the balance", In http://www.neurodiversity.com.au (acessado em 1/06/2007) .

Spengler, Tilman, (1991), Lenins Hirn. Hamburg, Rowohlt.

Stahnisch, Frank W. (2003), "Making the Brain Plastic: Early Neuroanatomical Staining Techniques and the Pursuit of Structural Plasticity, 1910–1970?", Journal of the History of the Neurosciences, Vol. 12, No. 4: 413–435.

Swain, Joan & Cameron, Colin (1999), "Unless otherwise stated: discourses of labeling and identity in coming out", In, Corker, Mairian and French, Sally (Eds.), Disability discourse. Buckingham, Philadelphia, Open University Press, pp. 68-78.

UPIAS (1975), Fundamental Principles of Disability, In,

http://www.leeds.ac.uk/disability-studies/archiveuk/UPIAS/fundamental%20principles.pdf (acessado em 1.04.2005).
Valenstein, Elliot S. (1998) Blaming the brain. The truth about drugs and mental health, New York, The Free Press.
Vidal, Fernando. 2005. "Le sujet cérébral: une esquisse historique et conceptuelle", Psychiatrie, sciences humaines, neurosciences, 3, n° 11, 2005, 37-48.
Young, Iris Marion (2004), "Foreword", In, Corker, Mairian and Shakespeare, Tom (Eds.), Disability/Postmodernity. Embodying disability theory. London, New York, Continuum, pp. xii-xiv.
Weiller C , Rijntjes M . (1999), "Learning, plasticity, and recovery in the central nervous system", Experimental brain research, 128 (1-2): 134-138.
39
Weintraub, Kit (2005). "A Mother's Perspective ", In. http://web.archive.org/web/20051216174906/http://asatonline.org/resources/library/moms_perspective.html (acessado em 25.06.2007).
Wickelgren, Ingrid (2005), "Autistic Brains out of Synch?", Science, vol. 308: 1856-1858.
Wing, L. (1981). "Asperger's syndrome: A clinical account", Psychological Medicine 11, 115-129.
________ (1997) "The History of Ideas on Autism: Legends, Myths and Reality Wing", Autism, 1: 13-23
Winter, Arthur & Winter, Ruth. 1987. Build Your Brain Power: The Latest Techniques to Preserve, Restore, and Improve Your Brain's Potential, St. Martin's Press.
Zahavi, Dan (2005), Subjectivity and Selfhood. Investigating the First-Person Perspective. Cambridge, Mass., and London, The MIT Press.
Zimmer, Carl (2004), Soul Made Flesh: the discovery of the brain – and how it changed the world. New York: Free Press/ Simon and Schuster.